sexta-feira, 23 de novembro de 2012

DE CHUVA, LUA E SAUDADE



                O menino Tiê ia pensativo, montado sobre o cavalo sem sela, em pelo, e com uma pequena corda que fazia às vezes de rédea. Não haveria risco, pois o animal era dócil e muito manso, o mais antigo da Fazenda Nova América. Por ser tão mansinho fazia a alegria da meninada e servia para pequenos serviços, ali perto, como agora, que levava o almoço para seu pai no eito da roça.
                Era o que o menino Tiê fazia agora. Perto de onze horas da manhã, sob chuva fina e intermitente ia pensativo.
                Já estava de férias. As aulas daquele ano já haviam terminado e ele agora se dedicava a ajudar o pai na lavoura e a mãe em casa. Havia também tempo para suas brincadeiras, tempo para “atentar” sua irmã Fátima e seu irmãozinho pequeno – chorão demais para ele – mas que gostava muito.
                A chuva fina a intermitente trazia frio. E o menino Tiê começava a se impacientar, pois com o terreno escorregadio o cavalo andava mais devagar, e o percurso não rendia;
                Em seus pensamentos, o menino Tiê se lembrou do doce sorriso daquela colega de escola. Quase não se falaram durante o ano. Apenas a olhava a distancia e percebia olhares rápidos, fugazes em direção a ele. Durante todo o ano foram poucos diálogos, conversaram muito pouco. Mesmo quando dançaram quadrilha na festa de São João, embora estivessem por muitas vezes juntos lado a lado, a timidez os impediu de olhar nos olhos – como gostaria – e talvez declarar seu amor.
                Ainda guardava o calor das mãos dela nas suas, pois dançaram de mãos dadas. Na verdade o menino Tiê parecera que não dançara quadrilha, mas flutuara, em momento de doce enlevo e encantamento.
                Imerso em sua saudade quase não percebeu chegara ao destino. A voz doce e cheia de candura do Pai o despertou. Desceu do cavalo e entregou a ele a humilde e surrada vasilha onde estava o almoço. Mesmo tendo almoçado, seu pai sempre oferecia um pedaço daquilo que havia de mais saboroso na comida, mas naquele dia não quisera. Então seu pai o deixara sossegado. Conhecia o jeito dele.
                Com o olhar distante nem percebeu que o local onde plantaram milho havia poucos dias estava coberto de verde escuro, com as tenras e delicadas plantinhas cobrindo o chão, que há pouco fora de um tom cinza. Tornara-se em poucos dias imenso tapete verde. Teriam colheita farta rapidamente, que era a certeza de alimento à família e trato aos animais da fazenda. Talvez ainda sobrasse alguma coisa para vender na cidade e apurar um pouco de dinheiro.
                Durante aquela tarde o menino Tiê pouco conversou. Sentia algo no coração, não conseguia sair da lembrança o doce sorriso da menina da escola.
                Somente ao fim da tarde, depois do trabalho na roça e durante o banho de riacho que voltou ao seu jeito de sempre. As brincadeiras e a alegria de seu pai no córrego o fizeram novamente feliz. Brincavam como dois amigos, como dois meninos travessos.
                Depois do jantar, ouviu as canções ao violão dolente do pai e recolheu-se mais cedo. Não dormiu logo. Pelas frestas da pequena janela observava a claridade lua que do alto do céu trazia a lembrança de um lindo sorriso.
                Naquela noite, o menino Tiê sonhou.  Sonhou com aquela menina, que a enlaçava pela cintura e saia valseando, flutuando, sob a luz da lua.  De mãos entrelaçadas olhara-a nos olhos e recebera seu sorriso cativante. O menino Tiê sonhou. E em seu sonho, foi feliz aquela noite.

domingo, 18 de novembro de 2012

SAUDADE... EM PRECIOSA SOLIDÃO

                Os raios de sol que insistem em vencer nuvens insistentes e tardias – talvez por causa das chuvas do dia anterior – me convidam a circular pelas ruas da minha cidade.
                Rápida passagem na panificadora, onde senhores e senhoras apressadas – certamente para ter mais tempo de ócio – reclamam a lentidão do atendimento. Ao adentrar o carro e voltar para casa não me contive e me permiti deixá-lo deslizar pelas ruas asfaltadas, ir para “onde quisesse”.
                O trânsito tranquilo, calmo, consequência do feriado prolongado trazem de volta o prazer de dirigir devagar, sem pressa, podendo detalhadamente ver tudo que acontece em volta. As ruas estão tomadas por acácias floridas.  Nas calçadas inúmeros pés de Eugênia deixam o chão avermelhado com os folículos caídos das flores que, tocadas pelo vento ou provocadas pelos pássaros formam belo e majestoso tapete vermelho vivo.
                Observo um casal de velhinhos – com mãos entrelaçadas - a caminhar lentamente. Ele a conduz com extremo cuidado e muito carinho, pois os passos são menos firmes que os dele. O pequeno degrau da rua para a calçada, que outrora talvez nem fosse notado, agora parece barreira intransponível.  Mas com zelo e paciência ele faz com que ela vença o obstáculo. E recebe terno afago de carinho nas mãos, tão significativo como um beijo de amor.
             O canto de bem-te-vis e pardais se mistura à poesia de Chaul, e me faz adentrar aos recônditos do coração, onde fica guardada a saudade.
            Chego em um local maravilhoso, belo, onde a natureza se sobrepõe magnifica e exuberante. Pessoas anônimas fazem caminhada, correm. Ali inúmeras vezes conversei comigo mesmo, revisitei meus momentos, minha vida, meus últimos meses. Ao sentar no pequeno banco me vem à mente excertos das canções que ouvi no carro.
              Assim a poesia invade meu ser no clima ameno da bela manhã, onde sobre plantas rasteiras e verdes o orvalho da madrugada/noite teima em resistir aos raios de sol. Sol que tenta a todo custo transpor os prédios que ficam ali perto. Gotas de orvalho seriam lágrimas de uma madrugada finda?



                A poesia invade meu ser. “Sabe o que eu quero agora, meu bem? Sair, chegar lá fora, encontrar alguém que não me dissesse nada, não me perguntasse nada também. Que oferecesse um colo, um ombro...” A canção talvez reflita algo de mim. Mas, “o amor só tem saudade do que não conquista?” ou talvez, “metade das coisas que sinto é amor por você, a outra metade, é mistura de sonho e prazer...”. O certo é que “O meu peito goiano é assim, de saudade brejeira, sem fim...”.
                Ah, saudade... Saudade do que vivenciei ou quase vivenciei, do que foi bom ou que sonhei um dia ser bom. Saudade de momentos felizes, significativos, momentos da juventude já quase “tão distante”. É sentimento, nostalgia. Apenas saudade, apenas saudade... Em momento de “preciosa solidão”

sexta-feira, 9 de novembro de 2012

FLAMBOYANTS, ACÁCIAS E MOMENTOS DE TERNURA



                A primavera e as primeiras chuvas deixaram as ruas e avenidas de Goiânia cheias de beleza e alegria, com a vivacidade do vermelho escarlate das flores dos flamboyants e o delicado rosa- bebê nos cachos generosos das acácias.
                Mesmo diante do ruidoso e frenético vai-e-vem de veículos, com seus motoristas apressados e impacientes, os flamboyants e as delicadas acácias estão presentes  nas esquinas, nos canteiros, sempre majestosos e imponentes.  Os Imensos cachos de flores generosamente acolhem os pequenos insetos e abelhas, que fazem a polinização.
                Impossível não notar e ficar emocionado com essa beleza. O espetáculo das coloridas flores deixa mais ainda belo o lugar que cerca a arvore. Ao chão, um colorido tapete se forma com pétalas que já cumpriram sua função, de alimentar e propiciar que sementes venham, trazendo renovação, fertilidade. O ciclo benéfico e interminável da vida.
                A bela e acolhedora Goiânia oferece lugares e oportunidades de lazer e cultura fantásticos. Pertinho da minha casa, tem o Parque Cascavel, que, apesar do nome um tanto quanto assustador – decorrente da denominação do pequeno córrego que margeia – é local aprazível, bem cuidado e seguro.
Local ideal para a prática de esportes como caminhada e corrida, em contato com a natureza em alguns lugares importante, é também ponto de encontro de famílias.
Não esqueço a ensolarada manhã de domingo, quando estive no local pela primeira vez. Sentado no banco que fica do deck do lago, observei ao longe um casal jovem, com duas crianças pequeninas e um cãozinho de estimação.
Enquanto as crianças brincavam com o esperto cãozinho ali pertinho, o casal de abraçava e se beijava de forma sutil, com mãos entrelaçadas, olhos nos olhos, certamente trocando juras de amor eterno e vivenciando muito a emoção daquele momento único de felicidade e alegria. De repente, um dos pequenos acaba o enlevo, abraçando à perna do pai, talvez querendo dizer: “cuidem de mim, estou aqui”. Em instantes, o pequeno estava nos braços do pai cuidadoso, e diante do sorriso de encanto e ternura da mãe. Emocionante momento.
A primavera embelezou mais ainda minha querida Goiânia. As chuvas vieram agora mais intensas e freqüentes, propiciando um clima ameno e agradável.
Flamboyants e acácias floridos, crianças a brincar no parque e casais de mãos entrelaçadas trazem a sensação que a vida pode ser plena. Basta que consigamos traduzir esses pequenos momentos. De ternura e felicidade.