sexta-feira, 11 de agosto de 2017

TEMPO DE PREPARAR AS SEMENTES




Nos meses que se seguiam à colheita e com o fim da temporada das chuvas a lida na Fazenda Nova América era intensa. Meu pai, ajudado por alguns trabalhadores, iniciava o preparo a terra no local onde seria plantada a futura roça. Era sempre assim: mal terminada uma colheita, já era hora de preparar um local previamente escolhido, retirar o mato alto com foices e machados e organizar tudo em montes ou leirões, também chamados de coivaras.
Dali a algum tempo, quando o mato secava, colocava-se fogo e a exceção dos galhos mais grossos, quase tudo se transformava em cinzas. Ao lado dessas coivaras eram plantadas sementes de abóbora, melão e melancia, que após nascidas, rapidamente subiam naqueles galhos secos, enegrecidos pelo fogo. E mesmo sem jogar sementes e não obstante ter sido colocado fogo naquele local, nasciam sempre vigorosos pés de bucha, que eram utilizadas em diversos serviços de higiene e também de melão de São Caetano, uma planta muito usada para fins medicinais.
Após o preparo do local da roça, era hora de escolher as sementes. Espigas de milho previamente selecionadas – as graúdas e grossas – tinham as palhas retiradas e os grãos de parte delas selecionados. Deixava-se apenas uma pequena quantidade em cada ponta que eram debulhados e destinados a alimentar os animais. Nas sementes de arroz a feijão, adicionava-se uma pequena quantidade de veneno, para que as formigas e outros predadores naturais não impedissem a germinação.
Quando chegava agosto, mês de muitos ventos e seco, as águas do pequeno córrego que servia a fazenda baixavam um pouco. Mas tudo era compensado pela beleza dos ipês floridos que rodeavam a fazenda. Ipês roxos, amarelos e por ultimo os brancos davam vida e traziam a certeza que a natureza estava apenas se preparando para mais um espetáculo majestoso e belo, assim que começassem a cair as primeiras chuvas.
E por falar em chuva, no mês de agosto, por diversos momentos, meu pai ficava a fitar o horizonte, observando o movimento das nuvens. Fazia isso pela manhã, no meio da tarde e ao fim do dia. Ficava a olhar a barra do dia, para que com a sabedoria milenar recebida de seus antepassados, soubesse se a chuva estava próxima ou não.
Era comum nos meses de junho e agosto caírem algumas chuvas, chamadas de chuva das flores. Em junho, trazia frio e em de agosto, deixava o clima suave, ameno, ainda que por alguns dias.
E não havia tempo para descansar. Nesse hiato de tempo, hora de reformar as cercas, o paiol, os mangueiros onde se criavam porcos, corrigir as estradas de acesso à propriedade, combater as teimosas saúvas e um sem numero de serviços que exigiam muito esforço e dedicação.
Depois de todo esse trabalho, com a terra pronta, as sementes preparadas e a fazenda arrumada, era esperar as chuvas que não tardariam, pois os sinais no horizonte captados por meu pai, as mangueiras abarrotadas de flores e o ir e vir de pássaros davam a certeza disso.
Era quando chegava o tempo de semear, recomeçar o circulo venturoso da vida, na incansável luta pela sobrevivência.
No mês de agosto sempre me vem à lembrança a figura terna e suave de meu pai. Aquele homem de mãos rudes, grossas e judiadas pelo trabalho árduo do cotidiano, ainda encontrava inspiração e forças para, ao inicio da noite espantar o cansaço e reunir a família em deliciosos momentos de alegria, declamando versos cheios de poesia, ao som do seu violão dolente.
Naquele momento, independente da época do ano, era hora de semear – e também colher. Semear amor, carinho e ternura em nossos corações e colher sorrisos, harmonia, paz.

E é com essas recordações e saudades que venho homenagear e parabenizar os pais pelo dia. A todos, um feliz e abençoado dia dos pais!




sexta-feira, 4 de agosto de 2017

ASSIM, SEGUIMOS... E CAMINHAMOS!



Às vezes, deixo-me levar pelos embalar da vida e qual uma rede a balançar, e não percebo o tempo passar. É como se estivesse em absoluta letargia e ainda que com a ocorrência das manhãs ou dos maravilhosos entardeceres do outono passado e agora do inverno – sempre tão belos –, simplesmente não mensuro o quão rápido o tempo se esvai, qual areia entre os dedos das mãos.
Isso reflete em meu rosto, e as poucas, brancas e desalinhadas cãs combinam bem com a barba – também branca – que recobre minha face.
Entre os últimos meses do outono e este inicio de inverno, o coração se voltou para outros rumos, que não a aparência. As prioridades passaram a ser a vida, o ser e a fé de que tudo se restabeleça, e volte à parâmetros rotineiros.
De repente tudo passa a ser a partir de determinado ponto, de determinado momento. Parece que o antes, o tempo passado e vivido se torna leve e suave lembrança, permeada de saudades de bons e alegres momentos.
Passa a contar a partir de uma madrugada fria de maio, quando por uma questão de minutos a vida permanece. A dedicação de socorristas ante a cena que imaginava ser apenas de filme, passa a ser o real e uma espécie de marco zero.  É no instante que se inicia uma luta ferrenha pela vida, luta esta amparada pela fé, pela confiança inabalável no Médico dos médicos que norteia a perícia e sabedoria dos profissionais de múltiplas áreas, que em equipe compartilham conhecimento e exercem seu sacerdócio, buscando a saúde e o bem estar de quem tanto precisa deles.
E agora o tempo, senhor da razão que é, passa a ser aliado. A cada movimento, por menor que seja, traz esperança e aumenta a certeza de que em breve, se possa ouvir uma voz ou mesmo perceber uma resposta consciente de que tudo pode ficar bem. Dessa forma os dias e noite do inverno e tornam mais suaves, pois a esperança se amplia.
Voltando para mim, quanto às brancas cãs em desalinho e à barba por fazer, penso que o que tenho de mais importante é a essência, aquilo de bom que está contido em meu coração e que norteia meu jeito de ser e de proceder.
Assim, continuar dando valor à coisas aparentemente pequenas e quase imperceptíveis, mas que se olharmos mais detidamente, são gigantes e muito mais importantes que questiúnculas, que sempre levam a lugar nenhum.
Viver em paz e harmonia, se permitir receber a brisa suave da manhã, acompanhada pela luz que vence a escuridão e faz o dia perfeito, quase sempre com fundo musical executado por gorjeios de pássaros.
É assim que tornamos melhor a vida, o existir, o cotidiano... E assim, seguimos, assim caminhamos!