quinta-feira, 20 de junho de 2024

"TINHA UM SONHO: IR PRA NOVA IORK..."

 


Imagem retirada da internet.


A partida do sertanejo – outrora "cantor internacional" de estilo romântico – Chrystian me faz ir a diversos e marcantes instantes da vida.

Desde a adolescência, na pequena e querida São Miguel do Araguaia até momentos de começo de vida a dois, em pequenas e agradáveis viagens no primeiro carro – um fusca 1977 – com minha pequena filha que em sua alegria e felicidade de criança curtia os movimentos da estrada, e logo adormecia no banco de trás.

Na pequena e saudosa São Miguel do Araguaia, antes da explosão da MPB de Zé Ramalho, Amelinha, Zé Geraldo, Belchior e outros, ouvíamos canções românticas “internacionais” do Grupo ABBA, Bee Gees, The Marmelade, Afrodite’s Child e de uma leva de cantores que cantavam em inglês, que depois soube-se que eram brasileiros.

Esta estratégia foi um investimento da indústria fonográfica do Brasil e países latino-americanos que deu certo. Cantores como Morris Albert, Terry Winter, Pete Dunaway, Steve Maclean, Michael Sullivan fizeram grande sucesso. Alguns ficaram pelo caminho, praticamente no anonimato, pois contratualmente sequer podiam cantar em português utilizando seu nome artístico. Mas alguns continuaram e se consagrariam em suas carreiras, como Fábio Júnior, Jessé e Chrystian (ao lado do irmão Ralf).

As canções em inglês que Chrystian cantava fizeram parte de minha adolescência. Era momento de descobertas, de início e de vivência de emoções. O coração começava a dar seus primeiros passos em afetividade e amor. Impossível não lembrar dos bailinhos de sábado à noite onde timidamente dançava-se de rosto quase colado com aquela menina que causava batidas mais fortes no coração.

Ou das serenatas feitas com toca-fitas nas janelas das pretendidas que quase sempre eram motivo de comentários, além de suaves e ternos sorrisos direcionados quando das reuniões do grupo de jovens no Salão Paroquial, após a missa das manhãs de domingo.

Chrystian gravou baladas de fácil tradução, com letras que traziam histórias, decepções (Lies é um exemplo) que caiam bem aos ouvidos e enlevavam a alma.

O tempo passou e em uma manhã de domingo do ano de 1983, no programa Som Brasil da Rede Globo – durante muitos anos, ao lado da Fórmula 1, audiência obrigatória dos brasileiros – vejo o Mestre Rolando Boldrin anunciar uma nova dupla: Chrystian e Ralf, O primeiro eu reconheci, mas o segundo não, embora depois eu soubesse que ele também fizera parte do grupo de cantores de sucesso “estrangeiros” dos anos 1970.

A afinação da dupla era algo de extraordinário e a carreira explodiu em incomparável sucesso, em grandes momentos da música sertaneja que à essa época já tinha ares de modernidade tecnológica e artística. Milhões de discos vendidos, shows em todo o Basil, na Europa e nos Estados Unidos da América.

Para mim, algumas canções da dupla se tornaram icônicas. Nova Iork, de 1989 (Essa é a história de um novo herói...), a emocionante e profunda Mia Gioconda (1996) uma regravação de um clássico de Vicente Celestino, originalmente gravada em 1946 e que fez parte da novela O Rei do Gado da Rede Globo, que tinha como protagonistas Antônio Fagundes, Patrícia Pilar, Raul Cortez e Glória Pires. E o clássico poético-musical de Chico Buarque e Pablo Milanés Yolanda – que chamo à atenção para o registro em DVD, facilmente encontrável no YouTube, em que eles são acompanhados por uma orquestra.

Nesse momento de tristeza e despedida de um artista, impossível não recordar as viagens no velho e eficiente Fusca, em direção ao norte goiano. Quando parávamos nos postos de combustível ou lanchonetes à beira da rodovia, de imediato vendedores ambulantes ofereciam fitas cassete gravadas. E dentre estas fitas, sempre havia uma de Chrystian e Ralf, e a canção preferida era Nova Iork.

“Essa é a história, de um novo herói...” Ou: “Tinha um sonho: ir pra Nova Iork, levar a namorada...”

Descanse em paz, Chrystian!

Obrigado por sua arte e talento!