sábado, 24 de abril de 2021

GALOS, MADRUGADAS, QUINTAL...




Razões de segurança e bom senso exigiram que eu retirasse do meu quintal uma mangueira que se tornava cada vez mais imponente, imensa, dominando grande parte do quintal, além de estender seus galhos sobre a varanda de minha casa e o quintal do vizinho.

Fiquei triste ao tomar tal decisão, afinal, ainda nem bem terminara sua última e generosa safra, deixando entrever entre suas folhas algumas mangas tardãs. Mas, era imperioso que o serviço fosse feito, para evitar prejuízos a mim e problemas ao vizinho. A árvore, generosa que sempre foi, pagava um alto preço por cumprir sua sina de crescer e dominar espaços.

E em uma triste tarde de sábado, um eficiente e cuidadoso “cortador” chegou, acompanhado de um ajudante e munido de motosserra, facão, cordas e outras ferramentas necessárias ao serviço. Embora pela manhã não houvesse prenúncio de chuva, o início da tarde veio com leve e suave chuva, como lágrimas de despedida dos céus.

Tive que acompanhar o trabalho de derrubada e retirada da mangueira, que aos poucos foi sendo desnudada, mostrando sua intimidade, de galhos fortes, mas não o suficiente para enfrentar a força e a rapidez da motosserra que com seu barulho característico, constante e até irritante ia aos poucos vencendo a agora indefesa árvore. Doía no coração, na alma o barulho de cada galho que caía.

Ao lado, no alto da goiabeira, um casal de pombas-do-bando que habita o quintal há muitos anos, observava e parecia perguntar o que era aquilo, o porquê daquele ato tão radical, afinal, era ali que eles há anos faziam seus ninhos, tinham seus filhotes, davam sequência à vida. Interessante é que nesse ano, resolveram fazer seu ninho um pouco afastado da mangueira, em um ponto alto e protegido da goiabeira.

Ao final, o quintal ficou órfão de sua árvore mais imponente, que dominava totalmente o ambiente. Por outro lado, a visão do céu, dos telhados vizinhos, do alvorecer e do entardecer ficaram mais amplos.

Aos poucos, fui me acostumando ao novo visual. Com a ausência da mangueira, o pé de goiaba se animou a novos galhos em direção ao vazio que ficou, a varanda ficou mais clara e ao alvorecer, as primeiras luzes do dia, seguidas do sol encontram espaço para gentilmente abraçar o meu canto.

Aliás, falar em alvorecer, começo sempre o dia muito cedo. Nem bem a madrugada se despediu da noite, já estou instalado em meu canto de home-office, na velha e quase secular mesa situada na varanda da cozinha, trabalhando em meus textos, sentindo o friozinho típico de Goiás, na companhia de canções vindas através das ondas do rádio e de uma generosa xícara de café, forte e com pouco açúcar.

O dia vai dando sinais que logo chegará. Primeiro, o som nostálgico de alguns resistentes galos em quintais da vizinhança, depois a chegada de tênues luzes no horizonte, quando o céu começa a adquirir cores fortes em tons amarelos e avermelhados, que parecem dialogar carinhosamente com as nuvens para que receba o irmão-sol em harmonia e plenitude. Os pássaros, ante as luzes que chegam começam sua sinfonia e seus movimentos de ir e vir, saudando o dia.

É meu recanto. Embora sinta saudades da imponente e generosa mangueira, ainda tenho por companhia uma pequena horta com pés de jiló, pitaya, açafrão, cebolinha, salsa, alecrim, capim santo (ou capim cidreira) e também uma parte com alguns poucos pés de mandioca, pé de goiaba, mamão, acerola, jabuticaba, uma imensa roseira que não tem espinhos, além de samambaias, orquídeas, e outros pequenos arbustos que dão belas flores que, embora os tenha há bastante tempo, não sei o nome.

Gosto muito daqui, onde posso ouvir canto de pássaros, ter bom ar para respirar e assim, poder ter uma vida saudável na metrópole. Preciosidade para mim que tenho minhas origens na roça, na querida e saudosa Fazenda Nova América.