Nos meses que se seguiam à colheita e com o fim da temporada das chuvas a
lida na Fazenda Nova América era intensa. Meu pai, ajudado por alguns
trabalhadores, iniciava o preparo a terra no local onde seria plantada a futura
roça. Era sempre assim: mal terminada uma colheita, já era hora de preparar um
local previamente escolhido, retirar o mato alto com foices e machados e
organizar tudo em montes ou leirões, também chamados de coivaras.
Dali a algum tempo, quando o mato secava, colocava-se fogo e a exceção
dos galhos mais grossos, quase tudo se transformava em cinzas. Ao lado dessas
coivaras eram plantadas sementes de abóbora, melão e melancia, que após
nascidas, rapidamente subiam naqueles galhos secos, enegrecidos pelo fogo. E mesmo
sem jogar sementes e não obstante ter sido colocado fogo naquele local, nasciam
sempre vigorosos pés de bucha, que eram utilizadas em diversos serviços de
higiene e também de melão de São Caetano, uma planta muito usada para fins
medicinais.
Após o preparo do local da roça, era hora de escolher as sementes. Espigas
de milho previamente selecionadas – as graúdas e grossas – tinham as palhas
retiradas e os grãos de parte delas selecionados. Deixava-se apenas uma pequena
quantidade em cada ponta que eram debulhados e destinados a alimentar os animais.
Nas sementes de arroz a feijão, adicionava-se uma pequena quantidade de veneno,
para que as formigas e outros predadores naturais não impedissem a germinação.
Quando chegava agosto, mês de muitos ventos e seco, as águas do pequeno córrego
que servia a fazenda baixavam um pouco. Mas tudo era compensado pela beleza dos
ipês floridos que rodeavam a fazenda. Ipês roxos, amarelos e por ultimo os
brancos davam vida e traziam a certeza que a natureza estava apenas se preparando
para mais um espetáculo majestoso e belo, assim que começassem a cair as
primeiras chuvas.
E por falar em chuva, no mês de agosto, por diversos momentos, meu pai ficava
a fitar o horizonte, observando o movimento das nuvens. Fazia isso pela manhã,
no meio da tarde e ao fim do dia. Ficava a olhar a barra do dia, para que com a
sabedoria milenar recebida de seus antepassados, soubesse se a chuva estava próxima
ou não.
Era comum nos meses de junho e agosto caírem algumas chuvas, chamadas de
chuva das flores. Em junho, trazia frio e em de agosto, deixava o clima suave,
ameno, ainda que por alguns dias.
E não havia tempo para descansar. Nesse hiato de tempo, hora de reformar
as cercas, o paiol, os mangueiros onde se criavam porcos, corrigir as estradas
de acesso à propriedade, combater as teimosas saúvas e um sem numero de
serviços que exigiam muito esforço e dedicação.
Depois de todo esse trabalho, com a terra pronta, as sementes preparadas
e a fazenda arrumada, era esperar as chuvas que não tardariam, pois os sinais
no horizonte captados por meu pai, as mangueiras abarrotadas de flores e o ir e
vir de pássaros davam a certeza disso.
Era quando chegava o tempo de semear, recomeçar o circulo venturoso da
vida, na incansável luta pela sobrevivência.
No mês de agosto sempre me vem à lembrança a figura terna e suave de meu
pai. Aquele homem de mãos rudes, grossas e judiadas pelo trabalho árduo do
cotidiano, ainda encontrava inspiração e forças para, ao inicio da noite espantar
o cansaço e reunir a família em deliciosos momentos de alegria, declamando
versos cheios de poesia, ao som do seu violão dolente.
Naquele momento, independente da época do ano, era hora de semear – e
também colher. Semear amor, carinho e ternura em nossos corações e colher
sorrisos, harmonia, paz.
E é com essas recordações e saudades que venho homenagear e parabenizar
os pais pelo dia. A todos, um feliz e abençoado dia dos pais!