sexta-feira, 5 de abril de 2019

PRECISAMOS VOLTAR A SORRIR







A expressão triste daquela senhora, que embora tentasse mostrar simpatia ao servir o café no pequeno copo de plástico descartável me chamou à atenção. Embora tentasse estabelecer uma conversa ao afirmar que seu café era torrado e moído em sua própria casa, seu semblante não escondia por certo algumas angústias.
Iniciei a conversa com ela, confirmando o sabor amargo forte do café, com pouco açúcar, exatamente como eu gosto.
Àquela hora da manhã, por volta de nove horas ela já se preparava para ir embora. Disse que chegara as cinco da madrugada naquele “ponto”, onde de segunda a sexta-feira vendia café, leite, salgados, suco, bolos e claro, pão de queijo.
Sua clientela era formada por pessoas que desciam no ponto de ónibus ali perto – muitos operários de obras de construção civil – além de pessoas como eu que, passando por ali avistaram a banquinha e resolveram se aproximar.
Reclamou de algumas continhas de fiado que deixou de receber de gente que trabalhava ali perto e ao ser demitida, não voltou para pagar o que devia. Segundo ela, era pouco, mas importante para ela.
Pedi mais um café e ela, enquanto organizava suas coisas, ligou para o esposo afirmando que em meia hora poderia vir buscá-la. De ônibus, tinha que ser os dois...
Por fim sentou, se serviu de um café com leite e escolheu um pão de queijo, dizendo que merecia, afinal também era filha de Deus.
E ali contou parte de sua história. Ela e o esposo tinham uma panificadora pequena, mas que dava para sobreviver e pagar as despesas da família, inclusive manter um filho na faculdade particular. Mas por volta de 2015 as contas não fechavam, a despesa aumentou e eles tentaram vender o estabelecimento, porém não conseguindo, resolveram fechar definitivamente. Com a venda do pouco estoque que tinham e dos fornos, pagaram os acertos trabalhistas de três funcionários e tristes e desesperançados voltaram para casa. Ao dizer isso, ela encheu os olhos de lágrimas. Confesso que também me emocionei, sentido um nó na garganta.
Continuando o relato, disse que aos poucos as coisas começaram a apertar. O esposo foi trabalhar como terceirizado em uma empresa de telefonia, vendendo planos “absurdos e irreais” e ela começou a fazer quitandas por encomenda.
Mas isso não foi suficiente e as coisas somente começaram a andar quando resolveu que poderia vender diretamente aos consumidores, procurando minuciosamente e escolhendo aquele ponto, onde disse ter acertado, como um local razoável.
O que ganhava ali não dava para pensar em futuro, uma vida melhor, “mas a gente garante ao menos o pão de cada dia e o pagamento de contas básicas como água e energia elétrica.”
Quanto ao esposo, ele deixou a empresa de telefonia e se dedica a ajudá-la, fazendo as quitandas, salgados e bolos para vender. Mostrou com orgulho fotos no celular do local onde fazem os produtos, realmente muito limpo e bem cuidado. E eles usando sempre aquela touquinha branca na cabeça.
Paguei minha pequena conta e saí dali com o coração apertado e reflexivo. A situação daquela senhora é a de tantos brasileiros, que sem emprego ou tendo perdido seus empreendimentos, buscam no comercio ambulante o único meio possível de sobrevivência.
São pessoas que estão esquecidos pelos governos, seja dos anteriores ou dos que tomaram posse no primeiro dia de janeiro. O eleitor pelas urnas retirou uma corja e elegeu um presidente e governadores com grande esperança, mas até agora, as coisas não andaram. Parece que o eleito está sempre em campanha, acompanhado de sua prole, e único assunto que tem é a reforma da previdência. Além, claro, da bagunça que reina entre seus ministros.
O brasileiro segue sua sina. Parece que tudo está bem somente para os detentores do poder, que podem dizer e fazer as besteiras que quiserem, afinal o seu polpudo salário está garantido antes do final do mês.
Enquanto isso, a luta é para sobreviver com o mínimo de dignidade e honra. Um povo bom, correto, e trabalhador precisa ser melhor cuidado pelos que têm essa obrigação.
É preciso ações para que se possa recuperar a confiança de dias melhores, ter esperança e acreditar que tudo pode mudar. E assim, voltar a sorrir!


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