sexta-feira, 20 de abril de 2012

POR CERTAS CANÇÕES...

          Pouco ou quase nada entendi quando vi minha mãe mandar que corressem e chamassem minha irmã, que estava lavando roupas no pequeno riacho que corria ali bem pertinho de casa. Entendi menos ainda ao ver seu estardalhaço e algazarra , quando chegou correndo, acompanhada por uma legião de mulheres que como ela também lavavam roupas.   Foram se postar ao pé do velho rádio ABC - A Voz de Ouro, que ficava na sala sobre um pequeno suporte colado à parede simples de taipa.
                Acompanhei a movimentação e olhando meio de soslaio pude perceber alegria e felicidade estampadas em seu rosto. Num átimo a sala encheu-se de pessoas, até trabalhadores da roça que estavam nas imediações vieram atraídos pela movimentação. A ansiedade de todos era nítida. Enquanto isso, no rádio podia-se ouvir alguns comerciais na hora nobre da manhã da Rádio Brasil Central de Goiânia.
                Logo a voz possante do Locutor Jacir Silva reaparece e afirma que em instantes iria ler uma carta - uma simpática cartinha.
                Na narrativa do locutor minha irmã mandava lembranças a todos na fazenda e em especial, a um jovem rapaz em uma cidade próxima, por quem seu coração estava meio que inclinado.
                Apesar do hiato de tempo ainda me lembro da canção. Não sei o nome, muito menos quem a cantava, mas era uma canção alegre e divertida, algo como “pegue sua esteira e seu chapéu, vamos pra a praia que o sol já vem...”.
                O locutor Jacir voltou a cumprimentar minha irmã e a todos na Fazenda Nova America com a costumeira alegria, tão peculiar ao rádio. E fez comentários sobre quem seria o felizardo que merecera aquelas palavras de carinho e consideração.
                Naquele e nos dias que se seguiram, parece que a costumeira alegria foi ainda maior na Fazenda Nova America.
Pouco tempo depois meu pai vendeu a fazenda e mudamos para a cidadezinha próxima. Universo diferente, distante daquela calmaria de outrora. No inicio estranhei muito, mas aos poucos fui me adaptando e como tudo na vida, o tempo é que cura o queijo.
Um dia chego em casa com e percebo uma pequena radiola. A seu lado alguns discos - LP’s e compactos. Acerquei-me da novidade, mas logo retornei à companhia do velho radio ABC, pois as opções ali eram poucas, limitavam-se a poucos discos. O radio me trazia bem mais opções e variedade.
Acontece que aquele rapaz, motivo da carta da minha irmã à Rádio Brasil Central e ao Programa do Jacir Silva, daquela manhã ensolarada da Fazenda Nova America, acabara se tornando seu namorado. E para trazer diversão e alegria sempre vinha com discos. Nos novos, que não eram emprestados, fazia questão de escrever: “para você, com amor”.
Assim conheci as belas canções italianas da época, as canções românticas de brasileiros que usavam nomes estrangeiros e as maravilhosas interpretações de Moacyr Franco, como “Cartas na mesa”.
A vida seguiu. Hoje a realidade das canções está mais perto de todos nós. Viraram simplesmente mídias. Tecnologias como Youtube, MP-3 e outras denominações tornaram acessíveis e muito próximas qualquer canção.
Mas nada se compara a canções que, anunciadas por um locutor como Jacir Silva através da Radio Brasil Central de Goiânia, em uma distante manhã ensolarada, entremeadas por comerciais e noticias, foram recebidas com alegria por um sem número de pessoas, em um velho rádio ABC – A Voz de Ouro na sala simples da Fazenda Nova América. E mais: canções que foram capazes de unir dois corações.
A magia do rádio. Que jamais perderá o encanto.

Um comentário:

  1. É verdade. O Américo tocando ai no âmago dos nossos sentimentos. Realmente, apesar de tanta tecnologia, é uma alegria imensa quando se escuta o rádio, mesmo sendo pela internet. Melhor ainda quando nos tornamos parte dessa família, ser cumprimentado como se já fosse de casa.
    Nenhum laptop, computador de mesa, ipad, ipod, mp3 player pode superar isso.

    Um dos textos mais profundos que você escreveu!

    Parabéns.

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