O menino Tiê ia
pensativo, montado sobre o cavalo sem sela, em pelo, e com uma pequena corda
que fazia às vezes de rédea. Não haveria risco, pois o animal era dócil e muito
manso, o mais antigo da Fazenda Nova América. Por ser tão mansinho fazia a
alegria da meninada e servia para pequenos serviços, ali perto, como agora, que
levava o almoço para seu pai no eito da roça.
Era o que o menino
Tiê fazia agora. Perto de onze horas da manhã, sob chuva fina e intermitente ia
pensativo.
Já estava de férias.
As aulas daquele ano já haviam terminado e ele agora se dedicava a ajudar o pai
na lavoura e a mãe em casa. Havia também tempo para suas brincadeiras, tempo para
“atentar” sua irmã Fátima e seu irmãozinho pequeno – chorão demais para ele –
mas que gostava muito.
A chuva fina a
intermitente trazia frio. E o menino Tiê começava a se impacientar, pois com o
terreno escorregadio o cavalo andava mais devagar, e o percurso não rendia;
Em seus
pensamentos, o menino Tiê se lembrou do doce sorriso daquela colega de escola.
Quase não se falaram durante o ano. Apenas a olhava a distancia e percebia olhares
rápidos, fugazes em direção a ele. Durante todo o ano foram poucos diálogos,
conversaram muito pouco. Mesmo quando dançaram quadrilha na festa de São João,
embora estivessem por muitas vezes juntos lado a lado, a timidez os impediu de olhar
nos olhos – como gostaria – e talvez declarar seu amor.
Ainda guardava o
calor das mãos dela nas suas, pois dançaram de mãos dadas. Na verdade o menino Tiê
parecera que não dançara quadrilha, mas flutuara, em momento de doce enlevo e
encantamento.
Imerso em sua
saudade quase não percebeu chegara ao destino. A voz doce e cheia de candura do
Pai o despertou. Desceu do cavalo e entregou a ele a humilde e surrada vasilha onde
estava o almoço. Mesmo tendo almoçado, seu pai sempre oferecia um pedaço
daquilo que havia de mais saboroso na comida, mas naquele dia não quisera.
Então seu pai o deixara sossegado. Conhecia o jeito dele.
Com o olhar distante
nem percebeu que o local onde plantaram milho havia poucos dias estava coberto
de verde escuro, com as tenras e delicadas plantinhas cobrindo o chão, que há
pouco fora de um tom cinza. Tornara-se em poucos dias imenso tapete verde. Teriam colheita
farta rapidamente, que era a certeza de alimento à família e trato aos animais da
fazenda. Talvez ainda sobrasse alguma
coisa para vender na cidade e apurar um pouco de dinheiro.
Durante aquela
tarde o menino Tiê pouco conversou. Sentia algo no coração, não conseguia sair
da lembrança o doce sorriso da menina da escola.
Somente ao fim da
tarde, depois do trabalho na roça e durante o banho de riacho que voltou ao seu
jeito de sempre. As brincadeiras e a alegria de seu pai no córrego o fizeram
novamente feliz. Brincavam como dois amigos, como dois meninos travessos.
Depois do jantar, ouviu
as canções ao violão dolente do pai e recolheu-se mais cedo. Não dormiu logo.
Pelas frestas da pequena janela observava a claridade lua que do alto do céu trazia a
lembrança de um lindo sorriso.
Naquela noite, o
menino Tiê sonhou. Sonhou com aquela
menina, que a enlaçava pela cintura e saia valseando, flutuando, sob a luz da
lua. De mãos entrelaçadas olhara-a nos olhos
e recebera seu sorriso cativante. O menino Tiê sonhou. E em seu sonho, foi feliz aquela
noite.
Perfeito! Tão singelo, tão intenso! Mais uma vez, você foi maravilhoso nas palavras, que dom!!! Não pare nunca de escrever... Que coração, que encanto de pessoa!
ResponderExcluirAhhh! quem nunca na infância de menino e passou por algo parecido...
ResponderExcluirÉ o Américo transparecendo nossas antigas emoções.
Como disse a Edilene, PERFEITO!
ResponderExcluirContinuo achando esta crônica PERFEITA!
ExcluirEste comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirÉ... Uma simples noite, mas, eternizada em seus pensamentos... Parabéns!
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