No inicio da semana, eu ouvi meu pai e minha mãe conversando sobre o
convite que receberam, de ir à Fazenda do seu compadre Zeca Silvino, que ficava
ali perto, para acompanharem a festa da entrega da Folia de Reis, que este ano
aconteceria lá.
De imediato fiquei alegre e ao mesmo tempo preocupado. Alegre, pela
infinidade de doces e guloseimas que era comum encontrar na fazenda do “Seu
Zeca”, como o chamávamos, feitas pelas mãos habilidosas de sua esposa, Dona
Eva. E preocupado, pois eu tinha medo dos irrequietos e barulhentos palhaços,
que viviam a correr atrás da me ninada. Eu era muito novo, muito criança, e por
isso tinha medo. Mas, papai não me deixaria fica r longe dele e assim eu me
sentiria seguro.
A festa ocorreria e dia de semana, e por isso, papai teria que parar mais
cedo o trabalho na roça. A fazenda do seu compadre Zeca distava cerca de uma
hora a cavalo, o que não seria muito longe.
Chegado o dia, papai veio mais cedo e quando fomos tomar banho no riacho
que ficava pertinho da nossa casa, disse a ele do medo que tinha dos palhaços.
Ele sorriu e disse que eu ficasse tranquilo, que estivesse sempre perto dele.
Assim, me pus a esperar com ansiedade que chegasse logo a hora de irmos.
Pouco depois do meio da tarde, nos pusemos a caminho. Papai ia em seu
cavalo e me levava na lua da sela. Minha mãe, acompanhada de meu irmão e minha irmã,
iam na velha mas eficiente carroça, puxada por um cavalo manso, que de tão
manso, era preguiçoso. Nos acompanhava o
sempre leal e incansável cachorro Guamá.
O sol já se punha quando chegamos ao destino. Fomos recebidos com alegria
pelo dono, compadre do meu pai, Sr. Zeca Silvino, que da porteira gritou pra a
esposa que havíamos chegado.
Fomos recebidos com alegria. Dona Eva, madrinha de minha irmã veio nos
abraçar, dizendo “como esses seus meninos estão grandes. Paulinho então,
espichou”.
E logo nos dirigimos ao local onde começavam a se aglomerar as pessoas
convidadas. Notei que ao barulho dos primeiros fogos, Guamá saíra em desabalada
carreira. Disse isso ao meu pai, mas ele disse que eu ficasse tranquilo, pois
ele sabia se cuidar.
Foram chegando muitas pessoas e logo a imensa barraca de lona ficou
tomada de pessoas, muitos tocavam seu instrumentos. Ouvia som de violões, violas acordeons e tambor. Mas, não
tocavam musicas, emitiam sons, como que para conferir a afinação
Logo após escurecer, começaram as orações. Rezaram o terço e depois
vieram os agradecimentos aos Santos Reis do Oriente, em versos rimados e quase
cantados.
Eu estava com um pouco de fome e de olho comprido nas guloseimas que
abarrotavam as mesas. Mas a regra era que, comida, somente depois da reza e da
cantoria.
O jantar foi servido por um numero grande de ajudantes, que entregavam a
comida a quem se aproximava. Primeiro foram os adultos mais velhos, que cerimoniosamente
tiravam seus chapéus, até que chegou a hora das crianças.
Jantamos e os violeiros começara a parte alegre. Em animada cantoria que
se formou logo uma turma que começou a dançar.
Mas, papai, sabedor que no dia seguinte, teria um dia difícil, nos chamou
para voltar. Meu irmão meio a contragosto, veio se juntar a nós. Queria ficar
mais e à distancia, namorar uma mocinha que se engraçara dele. Coisas de
adolescente.
Ao voltar, eu não pude deixar de perceber a beleza da noite. Uma lua
crescente parecia nos iluminar o caminho de propósito. O som da sanfona dolente,
foi ficando cada vez mais longe até que sumiu de vez.
Mas, para sempre, aquela noite, os cânticos, os versos declamados e o som
da sanfona estarão em um lugar do qual nunca sairão: do meu coração.
Vivas aos Santos Reis.
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