sexta-feira, 23 de março de 2012

ENCHENTE DE SÃO JOSÉ

            Nezinho Américo olhou para o céu nublado e com algumas nuvens esparsas. Em seguida, mirou o olhar para a roça de arroz, que depois de um verde vivo, agora apresentava um tom  amarelo forte, que significava estar pronto para a colheita.
      Estendendo a vista para um pouco mais longe, percebeu com alegria a roça de abacaxis, florada e com pequenos frutos em fase de crescimento. Prenúncio de ano bom, sinal de boa safra. A mãe natureza realmente fora muito generosa.
           Observou nuvens de pássaros-pretos que voavam sobre o arrozal, em alegre e ruidosa movimentação. Nezinho sabia que os pequenos seres de Deus também precisavam do alimento, portanto nunca se importou nem quis colocar veneno ou algo que impedisse os pássaros de usufruírem da dádiva oferecida pela mãe natureza. Entendia que os pequenos animais também tinham direito ao seu quinhão.
                Lembrou que era o dia 21 de março e a enchente de São José, a seu ver, ainda não acontecera. Apenas uma ou outra chuva forte, mas não tão forte como era a grande enchente tradicional do dia 19 de março. Lembrou que caso não viesse antes ou mesmo no dia 19, certamente viria três, quatro dias depois.
No dia seguinte reuniu um grupo de vizinhos, como o seu Compadre Zeca, o Cearense Sibila e o Baiano José Inhaó, além do menino Tiê, seu primogênito, que o acompanhava sempre.
                Durante dois dias trabalharam firme no cutelo, cortando e empilhando os molhes de arroz, ajeitando de forma que secassem e em breve pudessem ser batidos para separar a palha do grão. Mais alguns dias de sol e levariam para o terreiro em frente à casa da Fazenda Nova America e dariam inicio ao trabalhoso serviço. Juntaram tudo em um local próximo a um baixio, onde em determinada época do ano, corria um filete de água. Era somente aguardar.
                Na madrugada, Nezinho acordou com o barulho de trovões. Viu ao nascer do dia que o céu se armara com densas e escuras nuvens. Choveria forte. Preocupou-se, mas manteve-se sereno.
                Por volta de oito horas daquela manhã o céu começou a cair em forma de grossos pingos d’água, que acompanhados de ventos fortes logo fizeram escorrer forte enxurrada.  Sua esposa colocou o “Agnus Dei” detrás da porta da sala e rezou diante do pequeno e humilde oratório. Rezou a oração contra tempestades. Logo, os ventos amainaram, mas a chuva continuou forte e densa.
                Foram três horas de chuva forte e ininterrupta. Nezinho permaneceu impassível, sem dizer palavra. Sem se irritar ou mostrar revolta percebeu que tudo o que plantara e colhera de arroz naquele ano, fora por água abaixo. Viu a esposa derramar uma lágrima furtiva ao dizer: “é assim mesmo, Nêgo Véio, Deus tirou, mas dará outra vez”.
                Nezinho lembrou então que no ano anterior a safra fora generosa. Não passariam dificuldades.
                Recebeu com serenidade o resultado da forte e imensa chuva. Felizmente sua família estava garantida, a tulha estava cheia, pois colhera feijão suficiente e havia arroz para mais ou menos dois anos. E a roça de abacaxis daria para obter os recursos suficientes para tocar a vida no restante do ano.
                Lembrou que se São José enviara uma enchente tão forte, no ano anterior tivera uma colheita abundante.
                E foi assim aquele ano na Fazenda Nova America - ano que não se colheu arroz, mas onde houve uma produção de abacaxis como nunca se viu naqueles rincões.

Um comentário:

  1. Américo esse ai é texto que você falou que era um "ensaio"? moço melhor do que isso estraga. Tolo do editor(a) que não aproveitar essa preciosidade.

    (esse comentário já era para estar aqui bem antes, não apareceu, estou tentando de novo)

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