Sentado no pequeno banco de madeira, olhando o
titubear das chamas do fogo no fogão à lenha, o sertanejo põe-se a refletir.
Uma canção ao longe a servir de fundo musical naquele momento. A canção que ecoava
na humilde e simples casa, vinda de um velho rádio a pilhas que servia de
companhia constante a todos dali.
Estava calado, mas
feliz. O ano fora bom. As chuvas, tímidas, o inicio, vieram no tempo certo, em quantidade
e intervalos suficientes para que o arroz e o milho crescessem viçosos e
produzissem bastante. Na hora da colheita, a satisfação de ver que o esforço não
fora em vão. Que a fartura chegara.
As últimas chuvas
vieram fortes, a enchente de São José praticamente fecha o ciclo das chuvas, do
“inverno” chuvoso do ano. Ainda podia ver ao longe as marcas da ultima chuva. O
chão ainda parecia molhado e os desenhos na areia fina acumulada às margens da
pequena estrada ainda permanecia intocado.
Tinha a sensação
do dever cumprido. O paiol cheio, a sala da casa cheia de sacos de mantimentos,
ordenados até o teto da humilde choupana. Certeza do alimento para a família,
para os animais da fazenda. Ainda sobraria um pouco para ser vendido,
garantindo assim um pouco de dinheiro. Não era muito, mas à medida que se fizesse
necessário, ia vendendo aos pouco o excedente da produção. Milho, arroz e
feijão. Sem contar que no quintal, o mangueiro estava cheio.
Os ciclos da vida,
pensava. Ciclos que se completam. Como o das aguas. Que todos os anos ao vir,
traz a fertilidade, renovação da vida, fartura. É preciso apenas trabalhar a
terra, o restante a mãe natureza faz. Ciclos. Que vão e vem.
Como o ano fora
bom, a colheita farta, pensava em fazer algumas melhoras na fazenda. Poderia
começar por uma pintura na casa, uma reforma no curral e adquirir algumas reses
e animais para a lida da fazenda. Planos, que seguramente em breve implementaria.
Outra canção no velho radio evoca uma
saudade. Saudade dos tempos vividos, da mocidade, da juventude já um tanto
distante. A canção traz a saudade ao mesmo tempo em que surge no horizonte bela
e majestosa lua. Quase cheia, ainda crescente. Ladeada por estrelas tímidas.
Noite clara... Noite de luz.
Observando como que encantado a lua, que
aos poucos vai subindo no céu, põe-se a agradecer ao pai os resultados
bons. O árduo e difícil trabalho na roça
não fora em vão. Sob o sol inclemente ou chuva intermitente não parara,
continuara a lida, dera conta de tudo. O resultado aí estava.
O mugir tardio de uma rês no curral o traz
de volta a realidade. O tempo passara rápido. O radio ainda a trazer canções.
Hora de dar o merecido descanso ao corpo. E
com a lembrança da lua encantada daquela noite, foi buscar o carinho e os
braços da amada.
Na sua simplicidade, estava pleno, feliz.
Realizado. Amanhã, tudo recomeça. Mais um dia de trabalho. No interminável
ciclo da vida.
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