Há cerca de trinta anos que passo pelo
lugar, que hoje é o Anel Viário de Goiânia, que se situa nos limites da capital
com o vizinho município de Aparecida de Goiânia e ela está lá.
Comecei a passar por ali, quando ainda era
estrada de chão, resquício de antiga estrada boiadeira. Trata-se de uma
centenária Paineira, que muitos conhecem como Barriguda. Sobreviveu ao tempo.
Inerte, impassível até.
Fico a imaginar quanta coisa essa árvore já
viu. Quanta história presenciou. Hoje,
recebe impiedosamente o barulho e a fuligem dos carros que por ali passam. Pela
imponência e pelo porte, já deu abrigo a muita gente. Deu guarida, sombra amiga
e abrigo.
Foi pouso de peões de boiadeiro, que conduziam
suas manadas e aproveitavam para ali passar a noite. Não há duvida que eram
pousos animados, com cantorias de saudade, violões, histórias de onças e
aventuras imaginarias e de assombração.
A velha Paineira ali está. Impassível, mas
de aparência triste. O tempo, para ela, é indiferente. Tanto faz algumas décadas
ou mesmo um ano. Continuou ali, mesmo diante das mudanças que se apresentaram.
Felizmente, nenhum administrador público ou
gerente de companhia de limpeza urbana teve a ideia de removê-la, derrubá-la.
Sobreviveu à mudanças que ocorreram em sua volta. Do antigo pouco de boiada,
passando pelo movimento de pessoas e carros, até o hoje movimentado e perigoso
anel viário.
Traço um paralelo entre a vida e a velha
Paineira. Quantas vezes somos e agimos como a inerte e indiferente Paineira?
As mudanças ocorrem a todo momento e muito
perto de nós. Mudanças que chegam e temos que ser capazes de percebê-las, ao
contrário da velha e generosa Paineira.
Como por vezes, deixamos de contemplar a
beleza do luar, a nostalgia em uma canção acompanhada por plangente violão. E a
ternura que um casal de pássaros demonstra um ao outro, em suave enlevo,
inocente e verdadeiro namoro.
Os dias passam de forma rápida.
Implacavelmente rápido passa a vida. E sem viver e contemplar a beleza de um
alvorecer, enfeitado por canto de bem-te-vis e pardais, sem se deliciar com a
poesia e canção decorrente dos pingos de chuva no telhado, ou mesmo do encanto
do encontro das ondar do mar com o continente, como perceberemos a beleza que a
vida encerra?
Por vezes, adiar sonhos e projetos, também
faz parte disso. É necessário, em nome da razão e da sobrevivência.
Ao longo dos nossos dias, não podemos ser
inertes e ficar imóveis diante de tudo, como a Paineira da periferia de
Goiânia.
Há muito, muito que se viver. Viver
belezas, alegrias, saudades e reencontros. Que se transformarão novamente em
momentos felizes.
Então, ter de volta a poesia. Ter de volta
momentos de felicidade. De pura felicidade.
Com certeza uma das mais lindas crônicas que já li. Me fez voltar no tempo e relembrar outros lugares, outros tempo, outras histórias... Parabéns amigo Paulo por nos fazer emocionar.
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