segunda-feira, 11 de novembro de 2024
segunda-feira, 28 de outubro de 2024
A CAÇADA DA ONÇA E O TAMANDUÁ ATIRADOR
Quem conta esta é o Valdir, morador de Luiz Alves, na beira do Araguaia e
frequentador da região do Rio das Mortes no estado do Mato Grosso. E se alguém
duvidar do “acontecido”, pode ir lá e perguntar a ele. Lembro que Valdir é um homem
de respeito, muito trabalhador e jamais se prestaria a contar algo que não
fosse verdade. Talvez, no máximo, tenha suprimido um ou outro detalhe e
acrescentado outros, pelo tempo que o fato ocorreu, mas tudo o que narrou é a
mais absoluta verdade.
Disse o Valdir:
A minha Cumade Telvina andava incomodada com uma onça
que tava atacando os bezerros já fazia alguns dias. E todo mundo sabe que onça
quando acha presa fácil e não é combatida, o prejuízo tende a aumentar e muito.
Mas onça é bicho traiçoeiro, não pode ser uma pessoa
só para ir em busca dela. Tem que ser conhecedor do assunto e ir bem armado de
zagaia, uma boa catervagem de cachorro daqueles que não têm medo do ronco da
bruta. Cachorro mufino nem atravessa a pinguela do corgo quando fareja onça. Ou fica onde está ou volta correndo
pra casa. Na verdade, o trem é mesmo de dar medo.
Mas, caçador de onça naquela região do sertão bruto era difícil. Tinha uns que ficaram famosos, mas eram difíceis até de
encontrar, pois sempre estavam “a serviço” de fregueses distantes, e com
frequência se deslocavam para outras regiões para fazer seu serviço. Outros,
estavam vivendo de passado, enchendo o pandu de cachaça nos botecos.
Primeiro, ela falou com seu marido, o Cumpade Zé de
Anaia, que tentou desconversar:
— Ah, muié, larga esse trem, onça é bicho perigoso e
nóis num tem nem cachorro que presta. Logo essa marvada vai embora e deixa os
bezerro em paz. E parece que ela só anda pegano bezerro gabiru das lonjura,
daquele gado que num vem nem perto do curral. Larga disso.
Ao ouvir a resposta do marido, Cumade Telvina botou as
mãos nos quartos e disse:
— Ora, ora, larga de ser medroso, mufino, Seu Zé. Se
você não quer, eu dou um jeito sozinha. Quer saber? Vou já na fazenda da Cumade Ana e peço pro Cumpade
Valdir ir comigo. E se você tem medo de onça, eu não tenho não. Arreia minha égua que tô de saída. E se você num quiser vim junto, num vem.
Cumpade Zé deu uma chupada no cigarro de palha
apagado, olhou pra Cumade e viu que não tinha jeito. Tinha que ir mesmo. Sua
esperança era que minha véia e eu a convencêssemos que essa história de caçada
de onça era pra quem entendia muito do assunto.
Era dia de domingo e eu tinha acabado de almoçar.
Minha véia tinha feito uma panelada de canela amarela daqueles taludos e eu,
que tinha tomado umas duas – ou mais – da boa, entrei. Me fartei, pois o
tempero da patroa era bão demais. Depois, o jeito foi "caçar" uma rede debaixo do
pé de manga e puxar uma paia.
Passou um tiquim que eu havia deitado, tava ainda meio
cochiloso e escutei o latido dos cachorros. Pensei: deve ser algum bando de macacos por perto. Mas, quando o Malhado latiu, vi que era gente chegando. Malhado era
um cachorro muito inteligente e que nunca latia à toa. Pensei comigo, sem tirar
o chapéu de cima da cara: isso é hora de chegar visita? Espero que não seja o
compadre João Crente, que sempre chega em hora inoportuna com aquele mundão de livro
e se põe a tentar convencer a gente a bandear pro lado da religião dele.
Fiquei quieto, esperando que fosse gente de passagem na estradinha perto da minha casa, mas logo
ouvi minha patroa fazer aquele barulho de festa quando chega gente conhecida em
casa. E eu do jeito que estava, fiquei. Só ajeitei mais o chapéu pra
que pensassem que eu estava mesmo dormindo.
Mas de nada adiantou, não teve jeito: logo escutei o grito de Siá Ana, minha
véia:
— Valdir, vem cá, Cumpade Zé e Cumade Telvina tão
aqui.
Vixe, pensei, para eles virem aqui a essa hora do domingo, aconteceu alguma coisa grave. O jeito era
levantar. E meio contrariado, respondi:
— Já vou.
Dei umas duas espreguiçadas e sem opção, me dirigi pro
lado de casa, não sem antes enviar um olhar de tristeza pra rede: estava numa
preguiça tão boa...
Cumade Telvina era daquelas mulheres inquietas. Falava
alto e rápido. Assim que cheguei, logo depois que a cumprimentei, ela já disse:
— Cumpade, vim aqui pro senhor ir junto com o Zé caçar
uma onça que tá pegando meus bezerros.
Eita, aí lascou tudo. Eu já tinha recebido tudo quanto
é pedido pra fazer as coisas para os outros, mas caçar onça era a primeira vez.
E o pior: a Cumade no pouco tempo que estava lá em casa já tinha convencido
minha véia. Meio ressabiado, dei uma
olhada pro Cumpade Zé, que desviou o olhar para o chão, meio que querendo rir,
mas veiaco com a possível reação da mulher. Minha veia disse:
— Meu véi, vocês nem precisam matar a onça não, é só
passar um medo nela que logo vai embora. Só está reinando nos bezerros porque
acha que não tem gente por perto.
Ora se onça é bicho de “passar medo”, pensei. Quando
a bicha tá com fome ataca o que tem e se acha fácil, fica naquele oitão de
mato pro resto da vida.
— Mas minha veia, nóis num tem nem arma, nem zagaia,
nem nada. E esses cachorro daqui, se farejar o cheiro de uma onça, nem entra no
mato.
Mas a Cumade já tinha a solução:
— Tem os cachorro do finado Jacó, é só ir lá pedir pra
viúva Carmezina que ela empresta.
Aí eu vi que não tinha jeito mesmo. Ainda tentei
argumentar:
— Mas, e as armas? Espingarda de repetição nós não
temos, só de encher pela boca...
Aí, minha véia acabou com meus argumentos:
— Tem aquele revólver que foi do meu pai e a Garrucha Mão
de Égua.
Aí que danou tudo: onde já se viu caçar onça com revólver e garrucha... De verdade tinha mesmo essa
garrucha e o revólver que fora de meu finado sogro, só que tinha uns cinco anos
ou mais que eu não punha a mão nele. Devia estar pura ferrugem. Já a Mão de
Égua, vez em quando eu dava uns tiros com ela, mas era “de vez em quando”, pois
eu não gostava de arma pequena. Devia estar igual ou pior que o revólver.
Preferi não contestar. Fazia dó a cara da Cumade
Telvina, e minha véia, besta que era, se deixou levar por ela. Era ir pra cima
dessa onça fosse como fosse, ou, para o lado que a Cumade dizia que ela estava,
pra não ficar feio pra mim em casa. E até torcer para não encontrar a bicha
braba.
Resolvemos que iríamos no outro dia pela manhã. A Cumade
Telvina, ansiosa que era, ainda disse que dava tempo de ir hoje, pois onça não
caça de tarde, devia estar até dormindo. Como se ela entendesse de caçar
onça... Mas bati o pé e disse que hoje eu não iria, pois tinha almoçado muito e
bebido umas talagadas de pinga, além do mais, precisava descansar, pois na
semana que passou eu trabalhei no serviço pesado, consertando e refazendo
algumas cercas e tava com o corpo todo doído.
Falei isso olhando direto pra minha véia, que me conhecendo bem, sabia que de jeito nenhum eu iria naquela tarde de domingo. E além disso, era preciso ir na viúva do finado Jacó, arrumar os cachorros e preparar as armas. Percebi que a Cumade Telvina não ficara satisfeita, mas para ela, não tinha outro jeito. Era pegar ou largar. Ainda procurou com um olhar incisivo e desafiador o Cumpade Zé de Anaia e ele todo sem graça olhava pro chão. Então, disse que era melhor mesmo deixar para o outro dia.
Dei mais umas duas espreguiçadas, fui no pote de água e
bebi duas canecas cheias e buscando coragem onde eu não tinha, me pus a planejar
a aventura da “Caçada de onça”. Rapidamente tracei um plano.
Nesse momento, Cumade Telvina já tinha montado na sua égua
mansa e com a desculpa de fazer uma visita de pêsames se dirigiu para a casa da
Carmezina, viúva do velho Jacó.
Chamei o Cumpade na casinha de guardar ferramentas e
onde a gente cortava porco quando matava, pois lá dentro das fornaia eu tinha
umas garrafas de pinga amoitadas. Aproveitei que estávamos sozinhos e expliquei
meu plano a ele.
Disse em poucas palavras que a gente ia caçar a onça,
mas não ia caçar a onça era nada. Eu sabia que os cachorro do finado Jacó já estava
tudo desacostumado com esse negócio de caçar e conforme o resultado da
visita da Cumade na viúva, era melhor nem levar.
Falei para o Cumpade como a gente ia fazer:
— Óia, Cumpade,
a gente arreia os cavalos, vai até aquela Gameleleira assombrada, deixa os cavalo lá perto e entra um pouco dentro da mata, onde tem uns pé de Murici que depois dessas chuvas está tudo carregadin. E tudo madurin, madurin, que dá gosto. Depois, é só nóis dá uns tiros por lá e já volta logo, trazendo Murici pra colocar nas pingas e uns Pequi pra fazê com frango.
A gameleira que diziam ser assombrada ficava na
entrada do talhão de mato e perto dela tinha uns pés de pequi erados, que davam frutos
sadios e carnudos. Dava tudo certinho.
Veiaco e medroso, o Cumpade deu uma risadinha sem
graça, tomou mais um gole de cachaça, preocupado se o melhor não era caçar mesmo a onça,
pois a Cumade Telvina poderia desconfiar de nossa maçada.
Eu logo o desanimei:
— Ora, Cumpade, deixa de cisma, homi. Ela vai ficar é
quieta, sabe que onça é bicho ladino e que com meia dúzia de vira-latas velhos e
magros não adianta ir atrás.
Nessa hora, o Cumpade tava mais interessado em tomar
outro gole, antes que a Cumade chegasse. Acertamos de sair na manhã seguinte
quando o sol começasse a esquentar, depois de “tirar o leite”.
Taquei umas pingas boas nele, na esperança que
amanhecesse de ressaca e desistisse da empreitada, pois eu havia dito que
sozinho não iria. Mas, logo a Cumade Telvina chegou, deu uma olhada de soslaio
para o Cumpade Zé, que deu um jeito de esconder o “cu de burro” onde tava
bebendo da boa cachaça. E assim que a Cumade saiu de perto ele jogou o resto fora, não sem antes
olhar com tristeza aquele desperdício. Aquela era mesmo uma pinga muito boa,
que fazia tempo que estava guardada.
A Cumade voltou com a cara meio fechada dizendo que os
cachorro do finado Jacó que sobraram – muitos morreram – foram dados a um
cunhado dela, mas mesmo assim teríamos que ir, só que com os cachorros que tínhamos. Achei
foi bom, pois além de não ter que passar na viúva Carmezina pra buscar a tal
catervagem, seria mais fácil na hora de voltar. Falei para ela que não se
preocupasse, bastava que o Cumpade trouxesse um cachorro dele e eu levaria o fiel
e destemido Malhado, cachorro bom e obediente. Se um ou outro dos meus nos acompanhasse,
tudo bem, pois eu sabia que quando nos distanciássemos eles desistiriam.
Aliviada, Cumade Telvina se despediu, não sem antes
dizer que se eu quisesse, daria tempo de ir naquela tarde ainda. Fiquei foi
calado....
De noite, depois que rezamos o terço e fomos deitar,
notei que minha veia tava com ar preocupado. Não dei muita conversa, mas ela
não resistiu e meio chorosa disse que arrependeu de ter concordado com a Cumade
Telvina. Depois que ela foi embora, começou a se preocupar. Achava perigoso
demais eu e o Cumpade Zé, dois homens sem experiência em caçada de onça.
Procurei tranquilizá-la, dizendo que eu já tinha planejado como fazer, que
daria tudo certo. Senti naquele instante uma certa ternura em seu olhar. Minha
veia – Siá Ana – sempre esteve do meu lado, onde e como eu estivesse.
No outro dia cedo como de costume levantei para ir
tirar o leite e quando ela foi levar café no curral para mim, disse que faria
uma matula bem reforçada para mim e outra para o Cumpade. Concordei, pois
imaginei que a Cumade Telvina não tivesse esse expediente de zelar do Cumpade Zé
e ele, preguiçoso como era, bem capaz de não trazer nada.
Terminei de tirar o leite e fui arrumar minha traia. Quando
peguei o revólver e a garrucha Mão de Égua vi que aquelas duas armas não teriam
futuro na empreitada. Tavam que era pura ferrugem. No revólver o tambor onde se
colocavam as balas não abria e a Mão de Égua com muito custo consegui
destravar. Mesmo assim, tentei dar uma melhora, mas pouco ou nada adiantou. Não
falei nada para minha véia, apenas coloquei na capanga e fui afiar meu facão –
esse sim, eu sabia que não falhava nunca. Coloquei na cintura uma peixeira embainhada
e bem afiada do meu uso e fui em busca de uma vara de guatambu, para que
fizesse à maneira de uma zagaia – vai que a gente dava de cara com a tal onça.
Cumpade Zé chegou e foi dito e feito: como eu previra
ele não trouxe nada pra merendar. Ainda bem que minha véia lembrara dele. Aquele
coitado piava fino, sofria igual piolho na unha da Cumade Telvina.
Junto com as matulas coloquei meio escondido uns
quatro sacos de aniagem e uma garrafa de pinga de engenho da boa. Chamei o
Malhado e ele entendendo que a gente iria sair pra longe, se colocou ali perto
de onde eu estava. Também apareceram e deram a ideia que nos acompanhariam dois
viralatinhas do terreiro: Sabugo e Cupim. Eu sabia que esses dois logo desistiriam
da viagem. Cupim era mais velho, mas Sabugo, que aparecera filhote na porteira
da fazenda e fora adotado por Siá Ana, era corajoso e aprendia a cuidar do terreiro
junto com o Malhado. Eram inseparáveis.
Finalmente, depois de ultimados os preparativos, montamos
a cavalo e saímos com o sol já ardendo nas costas. A manhã estava bonita e o
verde das capoeiras e pastos estava de encher os olhos. Já fazia uns quarenta
dias que as primeiras chuvas vieram e de uma hora para outra a sequidão e o tom
amarelado e cinza da vegetação deu lugar a um verde de várias tonalidades e muito
vivo.
Apesar de estarmos no meio da manhã o ir e vir dos
pássaros chamava a atenção. Lembrei que estávamos em plena primavera e os
animaizinhos iam em busca de seus parceiros e parceiras para acasalar. O milagre
da vida e da perpetuação das espécies acontecendo.
Cumpade ia calado, imaginei que fosse ressaca. Com mais
de hora de viagem paramos em um pequeno córrego para beber e dar água aos animais
que pelo calor que estava suavam bastante e claramente demonstravam estar com sede. Tive a
certeza da ressaca do Cumpade quando ele deitou de bruços na beira do regato, molhou primeiro
o rosto e depois a cabeça e sorveu demoradamente a refrescante e límpida água.
Ao levantar, perguntei se queria algo pra comer e ele
disse que sim. Entreguei a marmita que Siá Ana fizera para ele, que me agradecendo,
disse que não conseguiu comer nada cedo, pois amanhecera com o estomago ruim. Para
não perder a piada ofereci um gole de pinga, mas ele fazendo uma careta, recusou de
mediato.
Voltamos a nossa jornada e em pouco tempo avistamos ao
longe a imensa gameleira que diziam ser assombrada, seguida do talhão de mata
onde segundo a Cumade Telvina estava se escondendo a onça.
Essa mata, virgem e intocada, ficava nas terras do Cumpade
e fazia divisa com as minhas. Era um lugar bonito, terra de cultura de primeira,
com inúmeros e centenários pés de Jatobá, Tamboril, Cabreúva, Aroeira e outras grandes e imponentes árvores e rodeada por
um pequeno cerrado onde prevaleciam os ipês, agora em suas últimas flores. Dava gosto
apreciar aquilo tudo. Lá dentro havia duas nascentes que curiosamente corriam para
lados distintos e formavam cada uma um córrego que ao longo do percurso recebiam
água de pequenos regatos. Desses córregos, um ia para a propriedade do Cumpade Zé
e outro para a minha. Chegamos na gameleira assombrada e apeamos dos
cavalos. Dos cachorros que vieram apenas o Cupim desistiu no meio do caminho. Malhado
e o pequeno e animado Sabugo nos acompanharam. Cumpade havia combinado de trazer um
cachorro seu, mas não sei se esqueceu ou se não quis trazer. Resolvi nem perguntar,
afinal, a gente não iria precisar mesmo...
Afrouxamos os arreios, tiramos a brida dos cavalos
para que pastassem a grama verdinha do lugar e deixamos eles amarrados com uma
corda longa, o que permitia que se movimentassem em curta distância.
Pequei os sacos que trouxe, entreguei um juntamente com
o revólver pro Cumpade Zé que o colocou na cintura sem sequer olhar para a arma; e fomos em busca de Pequis
e Muricis. Onça? Nem lembrávamos mais...
Combinamos que cada um iria para um lado para render o serviço de cata de Pequis e de Murici mas não ficaríamos muito longe um do outro. Estranhei que os cachorros acompanharam o Cumpade – Malhado não costumava se afastar de mim. Depois de tomar uma boa talagada, fui em busca do verdadeiro objetivo que me fizera deixar meu trabalho na fazenda e ir até ali: pequis e muricis.
Passando algum tempo, quando eu me refestelava com os
frutos doces de um pé de Murici, escutei foi o pampeiro. Uma algazarra danada
dos cachorros e gritos do Cumpade. Pensei alto comigo:
— É a onça!
Corri para o lado onde estava o barulho e ao me
aproximar, vi o Cumpade e o Malhado tentando livrar o Sabugo das garras de um
imenso Tamanduá Bandeira. Cumpade, certamente tentou atirar, mas o revólver, como eu sabia, não prestou. Restou a ele a opção de se aproximar do bicho, que
insistia em abraçar mortalmente o pobre do Sabugo e bater o cabo do revólver no focinho
do enfurecido Tamanduá. Naquele momento, talvez a única utilidade que poderia
ter.
Sei que o tal Tamanduá deu um tapa para o lado do Cumpade,
soltou o Sabugo que saiu ganindo alto e no gesto de volta quase rasgou a mão dele, quando passou as potentes
garras no dito revólver e no ato tomou a então inútil arma das mãos dele. Porém, com a fúria que estava e o revólver preso nas garras o Tamanduá certamente apertou a arma e pela força que fez no gatilho, girou o enferrujado tambor e disparou um tiro que
por pouco não acerta um de nós.
O barulho assustou o Cumpade, os cachorros e o bicho,
que saiu em desabalada carreira quebrando tudo quanto é mato que aparecia à sua
frente e a cada dois ou três pulos que dava em sua fuga disparava um tiro. Se contassem
para mim, eu nunca acreditaria nessa cena: um tamanduá imenso, bravo,
assustado, correndo e disparando bala pra todo lado.
O jeito foi esconder por trás de uma árvore que havia nas imediações, ato seguido pelo Cumpade Zé. Quanto mais corria, mais o bicho disparava o revólver. Até que parou, sinal que tinha soltado o revólver das garras ou acabado as balas.
Saímos no encalço do rasto do Tamanduá pelo “trieiro“
por onde ele tinha passado, mas nem sinal do revólver.
Pronto: tínhamos agora uma onça que comia bezerros e
um Tamanduá armado.
Vi que a atitude do Cumpade salvara o pequeno e
corajoso Sabugo, que recebera das unhas do Tamanduá dois cortes, felizmente não
muito fundos, um nas costelas e outro na pá. Apesar de assustado, logo estaria bom.
Como eu tinha sal na capanga, apesar de seus veementes protestos, passei na
ferida, com o intuito de evitar infecção. Quando chegássemos à fazenda eu aplicaria
antibióticos e antibicheira.
Ainda andamos pelas redondezas em busca de rastos da
onça, mas nada encontramos. Fizemos isso com a certeza que com o barulho dos
tiros disparados pelo Tamanduá a possibilidade de a danada estar ali perto era
praticamente zero.
Mas o que falar em casa? Não matamos a onça e ainda
perdemos o revólver. Sem contar que voltávamos cada um com dois sacos cheios de
pequi e Murici. O jeito foi combinar com o Cumpade duas coisas: primeiro, que a
gente tinha perdido o revólver quando os cachorros acuavam a onça. E depois que
a história do Tamanduá atirador ficasse só entre nós, afinal, ninguém iria acreditar
mesmo.
Aproveitamos o restante do dia e pegamos uma boa
quantidade de Pequi e Murici e no meio da tarde, ainda a tempo de apartar os
bezerros, chegamos à sede da fazenda.
Como combinado, contamos nossa versão da história
O fato é que nunca mais se ouviu falar de onça comendo
bezerro naquele lugar. Acho que a danada viu a coragem do Tamanduá e resolveu migrar
para lugares menos perigosos. Afinal, se onça tem medo de Tamanduá, imagina
armado com um revólver calibre 38.
Mas bom mesmo foi com o passar dos dias, ouvir a Cumade
Telvina gabar a coragem do Cumpade Zé, seu marido, que havia botado uma onça muito
perigosa pra correr na unha e com um revólver velho e enferrujado. Aliás, às
vezes ela dizia que achava mesmo era que ele tinha era matado a onça e
não queria contar a história toda pra ela.
Outubro 2024.
segunda-feira, 5 de agosto de 2024
SÃO MIGUEL DO ARAGUAIA: DEFINIDOS OS CANDIDATOS A PREFEITO E VICE E VEREADORES
As agremiações políticas
de São Miguel do Araguaia realizaram na noite desta segunda-feira (05) suas
convenções visando a confirmação dos candidatos a Prefeito, Vice-prefeito e
Vereadores que concorrerão às eleições de 2024.
Após uma movimentada
pré-campanha, apenas dois candidatos disputarão a cadeira de prefeito: Jeronymo
Siqueira Neto (PL) que traz como candidato a vice-prefeito o médico Dr.
Natanael Martins Coelho e Jadir da Farmácia (UB) tem como companheiro de chapa o
atual Vice-Prefeito, Pastor Eduardo Seabra.
Com a polarização entre
as duas candidaturas, presume-se que será uma eleição bastante concorrida, com os
candidatos buscando a vitória voto a voto.
A atual prefeita, Azaíde
Borges esteve presente na convenção que confirmou Jadir da Farmácia e Pastor
Eduardo Seabra, inclusive compondo a mesa.
Até o fechamento dessa matéria
ainda não tínhamos os nomes dos candidatos a vereador confirmados pelas
coligações. Oportunamente divulgaremos,
domingo, 4 de agosto de 2024
VALEU, TIBÁ
Último registro dos irmãos juntos, em Silvânia no final dos anos 1990. Da esquerda para
a direita: Tibá, meu pai Nezinho, Tio Américo (Timerquinho) e Tio Elias. Saudosa memória.
Soube
nesta noite quente de sábado inverno da passagem de Tibá – cujo nome era Francisco Américo
Araújo – meu tio, o mais novo dos irmãos do meu saudoso pai.
Tibá
morava na cidade do Rio de Janeiro, na Ilha do Governador e durante sua longeva
existência sempre foi um homem de bom coração e muito devoto a Deus. Minha convivência
com ele foi pouca, mas guardo comigo muitas lembranças, principalmente dos
tempos da infância, quando ele vinha nos visitar na querida Fazenda Nova
América, onde moravam meus pais e meus avós.
Tibá,
militar da Força Aérea Brasileira, entendia muito de eletrônica. Soube que
depois que passou para a reserva, ainda foi trabalhar em uma fábrica de radares
ligadas à própria Aeronáutica.
Muito
divertido, era sempre alegre, tocava violão muito bem e adorava canções de
Bossa Nova. Quando aparecia na fazenda, além das brincadeiras com meu pai e dos
banhos de riacho, por entender bastante de eletrônica, em um tempo em que um
rádio tinha imensa importância por ser o meio de comunicação mais popular e
abrangente, ele sempre dava jeito nos velhos e carcomidos aparelhos das pessoas
vizinhas. Se estava estragado, consertava, se estava mais ou menos dava uma
sobrevida. Nunca deixava um rádio, por
mais estragado ou velho que fosse, sem “falar”.
Uma
das últimas lembranças que tenho dele foi quando ele visitou meus pais que à
esta época moravam em Silvânia. Logo após o Jornal Nacional que meu pai tanto
apreciava ele nos chamou para rezar o Santo Rosário, uma de suas devoções.
Valeu,
Tibá. Siga em paz!
Paulo Rolim
sexta-feira, 2 de agosto de 2024
segunda-feira, 15 de julho de 2024
terça-feira, 2 de julho de 2024
quinta-feira, 27 de junho de 2024
quinta-feira, 20 de junho de 2024
"TINHA UM SONHO: IR PRA NOVA IORK..."
Imagem retirada da internet. |
A partida do sertanejo – outrora "cantor internacional" de estilo romântico – Chrystian me faz ir
a diversos e marcantes instantes da vida.
Desde a adolescência, na pequena e querida São Miguel do Araguaia até momentos de começo de vida a dois, em pequenas e agradáveis viagens no primeiro carro – um fusca 1977 – com minha pequena filha que em sua alegria e felicidade de criança curtia os movimentos da estrada, e logo adormecia no banco de trás.
Na
pequena e saudosa São Miguel do Araguaia, antes da explosão da MPB de Zé Ramalho, Amelinha,
Zé Geraldo, Belchior e outros, ouvíamos canções românticas “internacionais” do
Grupo ABBA, Bee Gees, The Marmelade, Afrodite’s Child e de uma leva de
cantores que cantavam em inglês, que depois soube-se que eram brasileiros.
Esta
estratégia foi um investimento da indústria fonográfica do Brasil e países
latino-americanos que deu certo. Cantores como Morris Albert, Terry Winter,
Pete Dunaway, Steve Maclean, Michael Sullivan fizeram grande sucesso. Alguns ficaram
pelo caminho, praticamente no anonimato, pois contratualmente sequer podiam cantar
em português utilizando seu nome artístico. Mas alguns continuaram e se
consagrariam em suas carreiras, como Fábio Júnior, Jessé e Chrystian (ao lado
do irmão Ralf).
As
canções em inglês que Chrystian cantava fizeram parte de minha adolescência. Era
momento de descobertas, de início e de vivência de emoções. O coração começava
a dar seus primeiros passos em afetividade e amor. Impossível não lembrar dos
bailinhos de sábado à noite onde timidamente dançava-se de rosto quase colado
com aquela menina que causava batidas mais fortes no coração.
Ou
das serenatas feitas com toca-fitas nas janelas das pretendidas que quase sempre
eram motivo de comentários, além de suaves e ternos sorrisos direcionados quando das reuniões do grupo de jovens no Salão Paroquial,
após a missa das manhãs de domingo.
Chrystian
gravou baladas de fácil tradução, com letras que traziam histórias, decepções (Lies
é um exemplo) que caiam bem aos ouvidos e enlevavam a alma.
O
tempo passou e em uma manhã de domingo do ano de 1983, no programa
Som Brasil da Rede Globo – durante muitos anos, ao lado da Fórmula 1, audiência
obrigatória dos brasileiros – vejo o Mestre Rolando Boldrin anunciar uma nova
dupla: Chrystian e Ralf, O primeiro eu reconheci, mas o segundo não, embora depois
eu soubesse que ele também fizera parte do grupo de cantores de sucesso “estrangeiros”
dos anos 1970.
A
afinação da dupla era algo de extraordinário e a carreira explodiu em incomparável
sucesso, em grandes momentos da música sertaneja que à essa época já tinha
ares de modernidade tecnológica e artística. Milhões de discos vendidos, shows em
todo o Basil, na Europa e nos Estados Unidos da América.
Para
mim, algumas canções da dupla se tornaram icônicas. Nova Iork, de 1989 (Essa é
a história de um novo herói...), a emocionante e profunda Mia Gioconda (1996) uma
regravação de um clássico de Vicente Celestino, originalmente gravada em 1946 e
que fez parte da novela O Rei do Gado da Rede Globo, que tinha como protagonistas Antônio Fagundes,
Patrícia Pilar, Raul Cortez e Glória Pires. E o
clássico poético-musical de Chico Buarque e Pablo Milanés Yolanda – que chamo à atenção para o registro em DVD, facilmente encontrável no YouTube, em que eles são acompanhados por uma orquestra.
Nesse
momento de tristeza e despedida de um artista, impossível não recordar as
viagens no velho e eficiente Fusca, em direção ao norte goiano. Quando
parávamos nos postos de combustível ou lanchonetes à beira da rodovia, de
imediato vendedores ambulantes ofereciam fitas cassete gravadas. E dentre estas fitas,
sempre havia uma de Chrystian e Ralf, e a canção preferida era Nova Iork.
“Essa
é a história, de um novo herói...” Ou: “Tinha um sonho: ir pra Nova Iork, levar
a namorada...”
Descanse em paz, Chrystian!
Obrigado por sua arte e talento!
quarta-feira, 17 de abril de 2024
SÃO MIGUEL DO ARAGUAIA: DONIZETH ALVES É O NOVO SECRETÁRIO DE TURISMO
Donizeth Alves da Silva |
A Prefeita de São Miguel do Araguaia Azaíde Borges confirmou na manhã
desta quarta-feira (17) a nomeação do empresário Donizeth Alves da Silva como
novo titular da Secretaria Municipal de Turismo, em substituição a Valmir
Pereira da Silva, que se desincompatibilizou para pleitear uma candidatura à
Câmara Municipal.
Donizete Alves, que até pouco tempo atuava no comércio varejista de
produtos farmacêuticos, possui larga experiencia no setor público – foi Secretário
Municipal de Saúde da vizinha Novo Planalto por dez anos – além de dois anos
como parlamentar na câmara municipal daquela cidade, e é um entusiasta do
turismo sustentável e de preservação.
Segundo Azaíde Borges, a escolha do nome se deu pela sua elevada
competência e comprometimento, além de ser um nome respeitado pelas entidades
empresariais, sociais e religiosas.
São Miguel do Araguaia, situada na região do Vale do Araguaia e tem o
turismo, ao lado do agronegócio, como um de seus pilares econômicos. No mês de
julho ocorre a famosa “Temporada do Araguaia”, quando o município, tendo como
porta de entrada o Povoado de Luiz Alves, recebe milhares de turistas vindos de
todo o país em busca das praias de areias brancas e tranquilas e da pesca
esportiva.
A posse do novo secretário será na próxima segunda-feira, em horário a
confirmar.
Pesca esportiva da Piraíba no Povoado de Luiz Alves Imagem: divulgação. |
domingo, 31 de março de 2024
SOBRE A EXISTÊNCIA
O goleiro José Américo (Tiê) em 1972 no time do Ginásio Anchieta. Último à direita, de camisa preta. |
A escalação do time. |
Nas primeiras horas deste
Sábado de Aleluia, meu irmão José Américo (Tiê) fez sua Páscoa. Depois de longos anos de calvário
e sofrimento, após o brutal acidente que o vitimou deixando-o inconsciente
sobre uma cama para sempre, ele parte para a Casa do Pai.
Por ser mais
velho, ele sempre foi minha grande referência e sempre fui seu grande
admirador desde a mais tenra infância.
Estão muito presentes em
minha memória afetiva as conversas de meus pais, tendo como fundo musical a
alegria do rádio, à luz do candeeiro nas noites quentes da saudosa Fazenda Nova
América, quando diziam:
— Tiê chega semana que
entra.
Ao ouvir isso, eu me enchia de expectativas.
Embora eu fosse muito menino, era sempre esperada a presença de meu irmão,
quando ele vinha para as férias escolares.
Tiê, como o chamávamos,
estudava no Ginásio Anchieta, na distante e centenária Silvania e vinha uma vez
por ano passar as férias em casa. Talvez pela distância e pelas dificuldades de
transporte, nem sempre era possível passar as férias de julho, vindo apenas ao final
do ano.
Lembro como hoje, quando
em um fim de tarde eu estava com meu pai tomando banho de riacho, e começamos a
ouvir uma pessoa assoviando alto na direção da estrada que vinha da casa do meu
avô e que dava acesso à cidade de Araguaçu.
Papai levantou a cabeça e
ao ouvir novamente os assovios, abriu um sorriso e disse:
— É Tiê.
Apressamo-nos no banho, subimos
a pequena ladeira e chegamos em casa ao mesmo tempo que Tiê. Bênçãos de pai e mãe,
abraços emocionados. Hora de boas conversas, de colocar fim a círculos de
saudade e claro, de muita alegria.
Outra lembrança que tenho
é quando eu era adolescente e morávamos em São Miguel do Araguaia. Tiê, já homem
feito, morava em Goiânia. Certa manhã, minha mãe escuta uma canção do Roberto Carlos
– Eu cheguei em frente ao portão – no alpendre de nossa casa e ao abrir a
porta, dá de cara com meu irmão. Novamente, momentos de alegria e emoção.
Estas e outras tantas lembranças
permanecem no meu coração, no meu inconsciente. Aliás, estas e inúmeras lembranças.
O tempo passou. Vieram
casamento, filhos, netos... Alegrias, tristezas, dores, batalhas pela sobrevivência,
conquistas, decepções. Típico da existência.
Mudanças, caminhos novos,
recomeços.
A vida seguiu.
Momentos difíceis são
passiveis de superação, mas há situações que não conseguimos prever e que
costumam nos pegar de surpresa. Um vírus letal, aquela curva no caminho, o coração que não suportou, um cruzamento
fatal, encerram sonhos, findam trajetórias que pareciam estar a poucos passos dos
objetivos traçados de felicidade e realizações.
Para uns o calvário se
estende por tempos e tempos. Para outros, acaba ali e em menos de 24 horas passa-se
a ser saudade, lembranças.
Mas é inexorável: a hora
da partida chega.
E o próximo segundo pode
ser o ultimo.
quinta-feira, 28 de março de 2024
EDILSON PINHEIRO: A HISTÓRIA DOS PIONEIROS E SUA LUTA POR LUIZ ALVES E PELO RIO ARAGUAIA
Edilson Pinheiro: uma vida em defesa da preservação do Araguaia e do turismo de Luiz Alves.
Por Paulo Rolim
Quem visita o Povoado de
Luiz Alves no município de São Miguel do Araguaia, ao se aproximar avista do lado
direito da rodovia a histórica casa construída pelo pioneiro José Francisco
Marques, situada a poucos metros das barrancas do majestoso Rio Araguaia.
A história da colonização
da região do Vale do Araguaia em Luiz Alves remonta ao final do século XIX,
precisamente em 1895 quando por lá chegou o pioneiro José Francisco Marques e
depois, na segunda década do século seguinte veio a família de Pedro Pinheiro
de Lemos que se instalou na margem matogrossense, do outro lado do rio. Unidas
e com coragem e determinação, as duas famílias desbravaram a região, até então habitada
somente pelos índios Karajá.
Era um tempo em que as grandes
distâncias, os recursos incipientes e os perigos e dificuldades que se
apresentavam a todo momento tornavam tudo mais difícil. As barreiras naturais,
assim como as cheias do grandioso rio aliavam-se às características de um
sertão bruto e desconhecido em um tempo que tudo era feito no braço e na
coragem.
Das duas famílias –
Marques e Pinheiro – vieram filhos, netos e bisnetos que protagonizam uma
história de honra, bravura e dignidade, que continua até hoje através da grande
descendência que se espalha nos municípios da região.
Um dos membros desta
família, cuja trajetória é repleta de nuances de dedicação à causa do meio
ambiente, do turismo e da divulgação do Rio Araguaia e suas riquezas é Edilson
Pinheiro, que alternou momentos da vida entre o trabalho pela causa
preservacionista e em empresas em São Miguel do Araguaia e região.
Conhecedor da história e
das particularidades locais passou a infância tendo o privilégio de acordar todas
as manhãs diante da vista do majestoso rio, seja em momentos de chuva e
enchente ou na temporada de praia, quando a movimentação se torna intensa pela
presença de gente de todos os quadrantes do país.
Foi ali, próximo as
barrancas de Luíz Alves que Edilson iniciou nas primeiras letras na escola
municipal, com a Professora Elvira Soares Marques, vindo depois para um período
de estudos em Goiânia e em seguida retornando a São Miguel do Araguaia onde fez
o então segundo grau – hoje ensino médio.
Muito jovem começou a
frequentar os campos de futebol de Luiz Alves e São Miguel do Araguaia,
disputando e colecionando inúmeras vitórias nos campeonatos amadores da cidade.
Jogou, dentre outras, nas equipes do Oceano, Málaga e Luiz Alves – tradicionais
na cidade.
Atuou como funcionário do
antigo Banco Bamerindus, onde permaneceu por quatro anos e depois foi trabalhar
com o pai, no segmento do agronegócio. Em São Miguel do Araguaia foi
proprietário de um bar, onde primava pelo bom atendimento a seus clientes.
Vendo o potencial
turístico do Vale do Araguaia, Edilson empreendeu em um escritório turístico no
Distrito Federal de onde agenciava grupos de turistas para visitar Luiz Alves.
Um empreendimento conhecido como “indústria sem chaminés”, que reconhece o
setor turístico como rentável, sustentável e promissor segmento econômico.
De volta a Luiz Alves e
São Miguel, foi funcionário do Grupo empresarial liderado por César Baiocchi e
Oton Nascimento, onde atuou como gestor da Pousada Jaburu, do Projeto de
irrigação do mesmo nome e em empreendimentos imobiliários. Após isso trabalhou
na implantação de empresas de vistorias terceirizadas junto do Detran-GO, como
Terceira Visão – hoje um player nacional – e Ivecal.
Importante destacar a
atuação de Edilson Pinheiro na defesa do meio ambiente quando participou
ativamente do Fórum de Defesa do Rio Araguaia e dos Lagos, cuja mobilização no
ano de 2013 levou à propositura e aprovação da Lei da Cota Zero, que proíbe o transporte
de pescado no Estado de Goiás com o objetivo de combater a pesca predatória e
incentivar a pesca esportiva. O
estabelecimento desta lei resultou no equilíbrio e restabelecimento da fauna
aquática do rio, proporcionando o ressurgimento de grandes peixes como as
famosas e encantadoras Piraíbas, hoje o maior atrativo para os pescadores esportivos
que buscam o Vale do Araguaia.
Em 2018 Edilson voltou definitivamente
para Luiz Alves onde desenvolve e operacionaliza projetos como o “BarcoHotel” e
promove incentivo ao turismo lado a lado com a conscientização e preservação
ambiental em parceria com empresas locais como Pousada do Pescador, Recanto das
Piraíbas e Rancho do Biguá.
Edilson Pinheiro faz
questão de divulgar o Rio Araguaia preservado e respeitado, para servir à
população ribeirinha e a toda a sociedade. Entende que o majestoso rio pertence
a todos é um grande patrimônio ecológico do Brasil. Sabe do potencial econômico
e da capacidade de promover mudanças na vida das pessoas simples que vivem às
margens do majestoso e importante rio, que para todos que ali vivem é como se
fosse uma extensão de sua casa.
Com isso, fomenta a
economia local e faz da preservação e do respeito ao meio ambiente sua missão
de vida e seu ideal.
Edilson Pinheiro |
terça-feira, 26 de março de 2024
PABLO MARÇAL PARTICIPA DE PESCARIA NO RIO ARAGUAIA
CONHECIDO EM TODO O PAÍS, INFLUENCIADOR PARTICIPA DE EVENTO RELIGIOSO EM SÃO MIGUEL DO ARAGUAIA.
Imagem: Instagram Perfil Pablo Marçal |
O influenciador,
palestrante, conferencista e escritor Pablo Marçal desembarcou na última
sexta-feira no Aeródromo de São Miguel do Araguaia e dirigiu-se ao Povoado de
Luiz Alves, onde em uma breve parada reuniu-se com amigos e apoiadores. Embora informal, o encontro foi bastante concorrido, com a presença
de políticos, empresários, moradores e ribeirinhos.
Em seguida Pablo Marçal e
comitiva seguiram para uma pescaria nos rios Araguaia e Cristalino, onde se
hospedaram na Pousada Asa Branca. Imagens e vídeos da pescaria foram divulgados
através de diversos perfis nas redes sociais.
O influenciador veio a
convite do empresário e pré-candidato a prefeito Jeronymo Siqueira, de quem foi
colega na faculdade de Direito, e aproveitando a presença participa nesta terça-feira (26) às 19:30h do
evento religioso “Terça Profética” a ser realizada na Igreja de Cristo –
Ministério Apostólico Nova Terra, em São Miguel do Araguaia.
Natural de Goiânia,
Marçal de tornou conhecido através das redes sociais ao propor métodos de vida
que segundo ele levam à prosperidade e à paz interior. Publicou inúmeros livros
e mantém cursos de desenvolvimento pessoal que atraem milhares de pessoas de
todo o Brasil. Embora tenha sido eleito deputado federal por São Paulo em 2022,
não assumiu o mandato devido a questões documentais junto ao partido político
IGREJA DE CRISTO DE SÃO MIGUEL
Fundada em 1982 pelo
casal Jayme e Coracy Caixeta e pelo religioso norte-americano Robert Pop, a
Igreja de Cristo de São Miguel do Araguaia faz parte do Ministério Apostólico
Nova Terra e é presidida pelo Bispo Marcelo Costa Céo.
O evento desta
terça-feira, a “Terça Profética” é dirigida pelo Pastor Alex Ribeiro e tem em
sua definição “o propósito de transformar realidades através da Palavra e dons
espirituais.”.
Dirigente da Igreja há 23
anos, o Bispo Marcelo Costa Céo é casado com a Bispa Wanyspaula Céo e pai de
dois filhos – Samuel e Lucas. Nessa reunião com a presença de Pablo Marçal, ele
afirma que a presença do conferencista criou uma grande expectativa por
carregar em si alto potencial capaz de ser transformador de vidas.
TERÇA PROFÉTICA COM PABLO MARÇAL
LOCAL: IGREJA DE CRISTO SÃO MIGUEL DO
ARAGUAIA
DATA: 26/03/2024 - HORÁRIO: 19:30h
quarta-feira, 20 de março de 2024
terça-feira, 5 de março de 2024
sexta-feira, 23 de fevereiro de 2024
SENDAS DO VERBO - IV - NA FAZENDA
Quinzin acordou com o chamado do pai, um grito alto e
brusco.
— Levanta, moleque, que hoje você vai para a sede da
fazenda.
Quinzin demorou um pouco a entender, mas ficou alegre.
Apesar de desconfiado e com receio, começou a imaginar como seria o dia a dia
na fazenda do Sr. Jessé Capistrano.
O pai estava apressado naquela manhã. Rapidamente fez
a marmita de almoço que levava para o eito onde trabalhava e determinou que o
menino comesse logo.
Quinzin se virou como pôde. Rapidamente lavou o rosto,
comeu o beiju ainda quente e vestiu uma roupa limpa. Viu o pai desligar o
rádio, com o barulho característico e fechar as portas e janelas. Sem demora,
estavam a caminho da sede da fazenda. E o pai aquele dia estava com o passo
mais apertado.
Chegaram à imponente sede da fazenda e foram recebidos
pelo Sr. Jessé, que Quinzin já conhecia de vista. Trocaram poucas palavras e o
fazendeiro chamou uma senhora, que atendendo ao chamado, recebeu orientações e
levou Quinzin para o interior da residência. Passaram pela sala, com mobílias
que nunca vira igual, até que chegaram em uma ampla cozinha onde algumas
mulheres com lenços na cabeça cuidavam do almoço. A senhora, que tinha uma voz
suave e agradável chamou uma das mulheres e disse:
— Helena, este é o menino que veio para ajudar. Cuidem
bem dele e não o deixem se afastar da vista de vocês. E digam o que ele deve
fazer.
— Ele parece bonzinho, obediente, disse uma das
mulheres.
— Vem aqui, menino.
Helena, com quem Quinzin simpatizara de imediato,
perguntou se ele já havia comido algo naquela manhã, ele respondeu que sim.
— Tadinho, tão pequeno, disse Helena. E o que são
essas marcas? Seu pai te bateu?
E se escandalizou:
— Vejam aqui, olha só o estado desse pobre.
Quinzin sentiu a boca seca, o corpo formigar e as
pernas tremerem ao sentir os diversos olhares sobre ele. Não sabia se podia ou
não contar a verdade sobre a surra que levara. Limitou-se a baixar a cabeça,
com os olhos cheios de lágrimas.
Helena maternalmente, pegou Quinzin pela mão e o levou
até uma mesa cheia de iguarias, muitas que ele não conhecia. Ordenou que
sentasse e disse:
— Come, menino. Você precisa se alimentar bem, pois
terá muito trabalho pela frente.
Trouxe uma xícara com leite e um pouco de açúcar e
alguns biscoitos, colocou á frente dele, que timidamente começou a beber e a
comer.
Ficou ali algum tempo, esquecido. As mulheres
continuaram seu serviço na cozinha e vez ou outra, Dona Santa vinha ali para
verificar o andamento dos trabalhos. Passou por ele, mas apenas olhou, sem nada
dizer.
Depois de certo tempo, o Sr. Jessé apareceu. Deu a ele
um naco de rapadura e ordenou que o acompanhasse. Perguntou sobre seus irmãos,
sobre seu pai, mas Quinzin, tímido, pouco sabia dizer.
Levou-o até uma grande horta onde mostrou um balde
pequeno e outro recipiente – um regador. E perguntou a ele se daria conta de
molhar os canteiros. Quinzin disse que sim, e para que o fazendeiro soubesse de
sua agilidade, foi até o rego d’água e pegou um pouco de água, colocou dentro
do regador e foi molhar algumas plantas em um canteiro próximo.
Seu Jessé ficou satisfeito com a atitude do menino.
Disse que passaria algumas tarefas para que ele molhasse o que desse conta até
a hora do almoço e saiu. Quinzin tratou logo de fazer o que lhe fora ordenado.
A horta era um lugar magnifico, de imagens, vida e
aromas. Cercada de tela grossa, com um portão de acesso no rumo da casa e
diversos canteiros de alface, cheiro verde, pés de pimenta e alguns pés de
mamão (mamoeiros) carregados do meio até em cima. Tinha ainda em um dos lados
da cerca imensos pés de chuchu carregados de frutos de todos os tamanhos, dos
mais tenros aos que estavam em ponto de colheita.
Em um canto eram cultivadas plantas de variadas
espécies como arruda, erva-cidreira, capim santo, boldo, alfavaca, funcho,
hortelã e outros usados em meizinhas para atenuar e acalmar os males que
afligiam os moradores da fazenda. Mais longe, no outro extremo, encostado à
cerca um monte com esterco de gado curtido que servia para adubar a
plantação.
O Sr. Jessé havia passado como tarefa para ele molhar
cinco canteiros grandes. Quinzin achou fácil o serviço e alegre e animado se
pôs a fazer o serviço. Molhava com cuidado, para que ficasse bem feito. O balde
era pequeno, mas, por outro lado, se tinha que dar mais viagens entre o rego
d’água e os canteiros, era mais leve e cansava menos.
Nesse ritmo não demorou e terminou. Olhou com certo
orgulho para os canteiros e se sentiu feliz. Ouviu barulho de alguém que se
aproximava e viu que era Dona Santa. Ela veio até onde ele estava, olhou com
atenção os canteiros que ele havia acabado de molhar e disse:
— Ficou muito bom seu serviço. Vai lavar as mãos e vem
comer alguma coisa e depois você volta e continua.
Antes de saírem, Dona Santa recolheu algumas ervas e
verduras dizendo que eram para o almoço. Seguiram em direção à cozinha e lá, na
mesma mesa, uma farta e generosa merenda o esperava. Biscoitos de forno, alguns
que ele não conhecia, e um copo de leite.
Tímido que era, comeu pouco, mas dona Lena, que
cuidava da cozinha veio e disse que ele comesse bem pois estava muito magrinho
e precisava ficar forte. Então, deixando a timidez de lado, aproveitou e se
esbaldou. Estava gostando demais daquele lugar; mas sabia que tinha que voltar
logo ao trabalho e se apressou em terminar a merenda.
Ao chegar na horta se deparou com dona Santa, Seu
Jessé e um rapaz alto, conversando. Ficou quieto, como que não querendo ser
visto, porém dona Santa o chamou, a apresentou o rapaz alto:
—Quinzin, este é Dimas, ajudante na fazenda e vai te
ensinar direitinho o serviço.
Quinzin reconheceu aquela voz. buscou na memória, e
lembrou do palhaço da festa da Folia do Divino que o pegara nos braços e o
elogiara.
O trabalho era bem simples, além de cuidar da horta,
colocar milho e farelo para as galinhas e colher os ovos.
— Não se preocupe, rapaz, aos poucos você vai
aprender.
Pegou um cesto e entregou a Quinzin. O cesto era um
pouco grande e Quinzin teve certa dificuldade em carregá-lo, o que foi notado
pelo rapaz.
Dimas voltou a horta e trouxe o balde que Quinzin
carregara água para encher o regador e disse:
— Por enquanto você usa esse, até o patrão arrumar um
cesto ideal para o seu tamanho. E tem que que fazer esse serviço duas vezes ao
dia.
Foram em direção ao galinheiro. Quinzin se encantou
com a quantidade de galinhas, pintinhos e frangos e galos. Mais adiante, uma
cobertura com vários nichos forrados com palha de arroz, onde as galinhas
botavam os ovos. Dimas pediu que tivesse cuidado para não quebrar nenhum ao
recolher.
No começo, pegava com medo de deixar cair, mas aos
poucos se acostumou e passou a ter maior segurança e consequentemente, rapidez.
O rapaz era rápido e logo os dois estavam com seus respectivos recipientes
cheios de ovos brancos e azuis. Ainda encheram mais um cesto e foram em direção
à grande cozinha, onde deixaram os cestos sobre uma mesa.
Depois, foram para a horta. Hora de terminar de molhar
o restante dos canteiros e com as mãos arrancar as pequenas ervas daninhas, que
pareciam querer tomar conta de tudo. Aos poucos, foi limpando.
O tempo foi passando, o sol esquentando e Quinzin
sentiu sede. Foi até o rego d’água e sorveu boa quantidade. Foi quando Dimas o
chamou para o almoço. Estava na hora. No rego d’água, lavou as mãos e os pés, o
que foi feito também pelo companheiro de trabalho e subiram em direção a casa.
O local onde os trabalhadores almoçavam ficava por
trás da cozinha em uma das amplas varandas que cercavam a casa. Eram várias
mesas de madeira que juntas formavam uma só, ladeadas por grandes bancos.
Na cozinha e na varanda, sobre os fogões à lenha e
mesas, grandes panelas de ferro e de barro com carne, feijão e algumas cuias de
coité cheias de verduras como alfaces e outras que Quinzin ainda não conhecia.
Em uma mesa menor, próximo às panelas ficava uma pilha
de pratos e colheres, onde Dimas pegou um para ele e outro para Quinzin e foram
servir a comida. Aos poucos foram chegando trabalhadores e logo o local estava
cheio e com o vozerio dos homens que conversavam alegremente.
Era época de limpeza e recuperação de pastos e era
grande o número de trabalhadores eventuais. Muitos trabalhavam constantemente
na fazenda e outros eram empreiteiros que trabalhavam somente em determinadas
épocas do ano.
Quinzin comeu satisfeito, adorando a comida. Era bem
diferente da que tinha em casa, sempre com carne de porco, feijão e farinha.
Vez ou outra, um macarrão, mas o trivial era esse. E ali Quinzin comeu arroz,
iguaria que adorava, e que não tinham o hábito de fazer em sua casa.
Após o almoço, um breve descanso ali mesmo, diversos
homens olhando para aquele menino, alguns tecendo comentários, mas Quinzin
ficou quieto, esperando as próximas ordens.
Estava feliz. Como eram boas aquelas pessoas.
Deram-lhe muita comida, em nenhum momento gritaram com ele e o companheiro de
trabalho, Dimas parecia ser um rapaz tranquilo, que falava pouco, mas não se
importava de lhe ensinar o serviço com calma e paciência.
Dimas disse a Quinzin para voltar para a horta e
continuar a limpar o mato dos canteiros que ele iria dar uma ajuda no curral,
onde os vaqueiros estavam cuidando do gado.
O menino voltou para a horta e continuou de onde tinha
parado. Volta e meia para um pouco para esticar o corpo franzino, bebia água no
rego que corria ali pertinho e não raras vezes se encantava com os beija-flores
que a todo momento vinham visitar o lugar. Também apareciam por ali rolinhas,
bem-te-vis e outros que ele não sabia o nome.
O tempo foi passando e o sol já dava sinais que a
tarde começava a se acabar. Foi quando dona Santa o chamou pelo nome, dizendo:
— Vem, Quinzin, chega por hoje. Vai lavar as mãos e
vem comer um pouco antes de ir para sua casa.
O menino obedeceu e após se lavar a seguiu em direção
à cozinha que a esse momento estava vazia. Certamente as mulheres que lá
trabalhavam tinham ido para suas casas ou foram cuidar de outras obrigações.
Quinzin admirou aquele silêncio. De manhã o local era
bastante movimentado e nervoso, com as mulheres no seu ir e vir, barulho de
panelas, fogo e muita agitação. Quinzin comeu o que Dona Santa o oferecera
Ainda ouviu ela dizer: “Meu Deus, como está magrinho e
judiado esse menino...”
Quinzin ao sair da cozinha, ainda no corredor, deu de
cara com o Sr. Jessé, que lhe perguntou se gostara do trabalho. Timidamente
respondeu, de olhar baixo:
— Gostei.
Seu Jessé disse então que ele fosse para casa, que era
perto e que não tivesse medo. Qualquer coisa que acontecesse, gritasse alto,
que ele escutaria.
Quinzin estava temeroso sim de voltar sozinho para
casa. Sempre andou acompanhando do pai ou dos irmãos. Mas era preciso ter
coragem e seguir de volta para casa. E tinha mesmo que se acostumar, afinal, o
pai não viria buscá-lo todos os dias.
Estava feliz. Fora tratado como talvez nem lembrasse
mais. Ternura, carinho e aconchego foram coisas que só conheceu quando teve a
mãe por perto. Todos os dias após ele e os irmãos tomarem banho, ela vinha toda
cuidadosa e amorosa pentear os cabelos dos filhos. E após todos estarem
vestidos e penteados, dava beijos de carinho em cada um e não raro dois, três
irmãos disputavam seu colo, em alegre e feliz momento.
A maneira que Dona Santa e Seu Jessé o trataram o
surpreendeu. Dona Santa tinha um semblante de mãe que cuidava muito dos filhos
e sua voz suave o deixava seguro, apesar da adversidade que a vida lhe trouxera
até aquele momento. Foi imerso nesses pensamentos que não demorou e estava
chegando na humilde e simples casinha onde morava.
Era preciso cuidar das galinhas e do pequeno
porquinho. Depois, aguardar a chegada do pai para irem tomar banho no riacho e
depois jantarem.
Após colocar a comida para o porquinho, que o recebeu
com sua tradicional saudação, com gritos e roncos altos, com muito barulho.
Quinzin se permitiu ficar olhando o pequeno riacho e seus peixinhos, que com a
luz do sol da tarde pareciam pequenos fachos de luz a deslizar para lá e para
cá.
Novamente, veio aquele nó na garganta ao olhar para o
lado da mata onde Dé desaparecera. Sentiu uma mistura de revolta e saudade.
Onde estava Dé? Onde estavam seus outros irmãos? Será que estavam bem, tinham o
que comer e onde dormir? E será que não estavam judiando deles?
Sentou-se no pequeno tronco que improvisava como banco
e viu a tarde cair, cheio de saudade e recordações. Ouviu barulho para o lado
da estrada e percebeu que o pai estava chegando. Sentiu um calafrio e as pernas
tremerem. Era a dura realidade de volta, com a qual por algumas horas se
esquecera e até desacostumara.
O pai já entrou e gritou por ele. Ele correu e
respondeu ao pai, que perguntou como fora, se não dera trabalho e se obedeceu
direitinho aos patrões. Quinzin respondeu que sim, de cabeça baixa e tímido.
— Vou perguntar ao Sr. Jessé. Se eu souber que você
está aprontando, te quebro no pau, moleque.
Quinzin ficou calado. Sabia que o pai era bruto,
agressivo e era melhor nada responder. E calados, como se não notassem a
presença um do outro, se dirigiram ao riacho para tomar banho. Antes do banho,
o pai foi até o chiqueiro e olhando demoradamente para o porquinho, disse:
— Mais um mês e esse bicho estará pronto para abater.
Já tá ficando gordinho.
Quinzin ficou triste, com o destino do alegre e
barulhento porquinho, mas não se manifestou.
Depois, cada um pegou um balde com água – Quinzin com
um menor – e subiram em direção à casa.
Chegando em casa o pai ligou o rádio, que trazia
animação e um homem que falava coisas engraçadas, seguidas de um coro de
risadas. Vendo a curiosidade do filho, que fitava o rádio, o chamou para fora
da casa e disse:
— Tá vendo aqueles fios ali? Disse mostrando os fios
que, saiam do rádio e ultrapassando o telhado e se dividiam, esticados entre
duas grandes e altas varas de bambu fincados na lateral da casa, de um lado a
outro.
Quinzin mirou os fios sem entender muito o que o que
ele dizia. Continuou:
— Você deve estar pensando que tem gente dentro do
rádio, né?
— Sim, assentiu Quinzin, balançando a cabeça.
O pai riu, algo que raramente fazia e disse:
— Não tem ninguém dentro do rádio. O que você ouve,
sendo gente falando ou as músicas que passam, são feitos bem longe daqui. São
mandadas para todo lado, e chegam aqui em ondas, como o vento. Os fios, são as
antenas que “pegam” o que enviam e sai no rádio, aqui dentro, quando é ligado.
Quinzin entendeu mais ou menos, mas ficou aliviado.
Pelo menos, não tinha miniaturas de pessoas ali que poderiam sair quando eles
estivessem dormindo para beber água, comer o pouco alimento que tinham e outras
coisas mais. Lembrou que diversas vezes acordou de madrugada e ficou com medo
de encontrar pela casa algum daqueles “homenzinhos” que viviam dentro do rádio.
Enquanto o pai ouvia música e ensimesmado fumava seu
cigarro de palha, Quinzin dirigiu-se ao fogão à lenha e remexeu as brasas
adormecidas, cobertas de cinza, colocando sobre o borralho alguns gravetos que
se encontravam ali perto, e assim que o fogo pegou, buscou no terreiro dois
pedaços de lenha e colocou sobre as lavaredas que logo cresceram e o fogo logo
ficou vivo, iluminando toda a cozinha.
Depois disso pegou uma velha panela, com o exterior
preto de carvão e colocou sobre as chamas na chapa do fogão, foi até a
prateleira e com uma concha pegou uma porção de carne de porco que estava
dentro de uma lata e colocou dentro da panela velha, que fez aquele chiado,
barulho característico de carne e gordura na panela quente. Logo, estava pronto
o jantar, que constava de carne de porco com farinha e pedaços de mandioca que
já estavam cozidos.
Com cuidado, tirou a panela com a carne de cima da
chapa e colocou de lado. O pai, que
estava de olho em seus movimentos e se aproximou, recomendando que ele estava
fazendo tudo direito, mas que não se descuidasse, pois era perigoso se queimar.
Após o pai se servir, colocou a comida em seu prato,
velho prato esmaltado e sentou em um pequeno e carcomido banco de madeira que
ficava na cozinha.
Com um velho pedaço de tecido que de vez em quando
fazia as vezes de pano de cozinha, forrou o colo e colocou o prato sobre ele,
evitando assim que se queimasse. Começou a comer, lenta e calmamente. Adorava
aquela comida simples, era tão bom quanto fosse um lauto banquete. Lembrou da
comida da casa do Sr. Jessé, da fartura que era lá. Era muita gente para comer,
mas parecia que nunca faltava alimento naquela casa.
O pai, adivinhando seus pensamentos, perguntou como
fora lá, se tinha achado difícil o serviço, e se não aprontara alguma desfeita.
Quinzin respondeu que fora bom, que o serviço era
fácil. Achou que ele ia continuar a conversa, falar mais alguma coisa, mas
continuou calado, talvez prestando atenção no rádio que trazia canções alegres.
Terminando de jantar o pai foi até o pote, bebeu água e voltando-se pra
Quinzin, disse em seu habitual tom ameaçador:
— Se você aprontar na casa do Seu Jessé, já sabe....
Quinzin ouvindo isso, quase se engasgou com a comida.
Mas manteve-se quieto, calado, apenas baixou os olhos fitando o chão sujo da
cozinha. Mas, não tremeu as pernas, ou sentiu terror como outras vezes. Seu dia
fora bom demais, vira que existia outro mundo onde pessoas bondosas o tratavam
bem.
Viu o pai acender o cigarro de palha em um tição de
lenha do fogão e ir para fora da casa “pegar uma fresca”, como dizia. Quinzin
permaneceu onde estava, com o olhar fixo nas brasas do fogão, que aos poucos
iam perdendo a vivacidade. Das animadas e intensas lavaredas de há pouco,
ficaram somente as brasas, que depois de passarem por um tom vermelho vivo,
como as nuvens no céu ao entardecer foram aos poucos diminuindo a intensidade,
até que o branco das cinzas prevalecesse.
Inconscientemente, viu naquele fogo sua vida. Quando
tinha a mãe e os irmãos, era fogo vivo, alegria, agora, sozinho, ou quase
sozinho, pois tinha ainda a companhia do pai que não representava alegria ou
amor, sentia-se como brasa em vias de virar cinza.
Sentiu o cansaço chegar. O dia fora intenso, cheio de
novidades e descobertas. Era inegável que um mundo novo, até então
desconhecido, se apresentava, afinal, conhecia poucas pessoas, poucos lugares e
seu mundo até há pouco tempo limitava-se à casa simples onde moravam, o
convívio com os irmãos e com o pai. Da mãe tinha poucas lembranças, que sempre
estavam presentes em seus sonhos ou momentos de alegria. Eram poucas as
recordações, mas suficientes para acalentarem o coração de um menino de apenas
oito anos, que a vida jogara em um mundo até então cruel e desumano.
Foi até o pai que continuava do lado de fora e
pediu-lhe a bênção e se dirigiu até a esteira, onde deitou o corpo franzino e
esperou o sono tomar conta. Mas, o sono teimava em demorar a chegar.
As canções do rádio o mantinham atento, e mesmo depois
que o pai desligou e se recolheu, começou a prestar atenção aos barulhos da
noite. Canto de grilos, um ou outro uivar de lobos, o ritmado e constante canto
dos curiangos e outros sons que ele acreditava serem das estrelas.
Acordou com o barulho do pai abrindo a porta e
chamando as galinhas para a ração de milho diária. Acordou feliz, pois sabia
que em pouco tempo estaria em um lugar que gostara, e onde havia muita gente
que o tratara bem.
Tratou de lavar o rosto e comer o cuscuz que o pai
fizera. Pediu a bênção, e ouviu dele apenas um “bençõe”. Mais nada. Logo estava
pronto e em silêncio se puseram a caminho.
O trajeto era curto e ao chegarem na estrada, o pai
disse que ele deveria ir só. Foram apenas essas as palavras do pai para ele.
Assim, se dirigiu para a fazenda, olhando para o lado que o pai fora e vendo
sua silhueta sumir em meio a vegetação que ladeava a estrada.
Mais um pouco e estava na casa do Sr. Jessé. De longe
percebeu o burburinho e o movimento das pessoas que apesar de ser ainda muito
cedo, já estavam ali. Se aproximou
lentamente da casa e foi notado por uma das mulheres da cozinha, que o chamou
pelo nome dizendo:
— Quinzin, vai merendar.
Quinzin tentou dizer que já tinha feito seu desjejum,
mas viu ela sumir no meio das pessoas. O jeito foi obedecer e institivamente
seguiu em direção ao local onde havia almoçado no dia anterior, que se
encontrava cheio de pessoas.
Uma mulher deu a ele uma caneca com leite e indicou
uma mesa onde haviam de pães e outras quitandas. Pegou algumas unidades e se
deliciou com o gosto. Eram novidades para ele, que mesmo não estando com fome,
se apressou em comer.
Ouviu alguém dizer outra vez: “Tadinho, tão pequeno e
magrinho, judiado demais esse menino!” Olhou em volta e viu que era Dona Santa,
esposa do Seu Jessé que fizera tal afirmação. Ficou com certo medo, lembrando
das ameaças que o pai fizera na véspera. Mas ficou mais tranquilo ao ver que
ela se dirigia a ele, perguntando:
— E então, menino, pronto para mais um dia?
Quinzin não teve palavras. Apenas assentiu com um
movimento de cabeça.
Viu um trabalhador da fazenda se aproximar e perguntar
para dona Santa:
— É o filho que restou do Buíca?
— Sim, respondeu veladamente a senhora.
— Pobrezinho desse menino, respondeu o homem.
Quinzin se surpreendeu por aquele homem dizer o nome
de seu pai, ou o apelido pelo qual era conhecido. Raramente vira alguém
chamá-lo daquela forma, apenas de algumas pessoas na festa de Folia do Divino e
naquele domingo em que foram à vila buscar mantimentos para a semana.
Aos poucos, as pessoas foram deixando aquele lugar e
ele se viu sozinho. Sem saber para onde ir, resolveu permanecer até que alguém
viesse chamá-lo e indicar o que deveria fazer.
Com alegria viu
Dimas se aproximar e de maneira amistosa, chamá-lo para começarem o trabalho.
— Vem comigo, Quinzin, hoje vou te passar as tarefas.
E você vai ter que se virar sozinho, pois não posso ajudar, tenho muito serviço
no curral.
Foram para a horta e Dimas indicou a Quinzin quais os
canteiros que deveria molhar e onde deveria limpar das ervas daninhas. Mas,
antes da horta, era preciso recolher os ovos. Não poderia esquecer que tinha
que pegá-los de manhã e de tarde.
— Vem comigo que quero te mostrar uma coisa, disse.
Foram até a frente da casa onde havia um jardim com
diversas plantas ornamentais. Eram roseiras, orquídeas, lírios, samambaias de
chão, e outras que ele não conhecia. De imediato se encantou com elas. Dimas
pediu que ele todos os dias, nesse tempo de seca, além da horta, molhasse e
limpasse aquele local. Poderia pegar água bem pertinho, no bebedouro das vacas
que ficava no curral em frente. Recomendou que cuidasse muito bem pois eram
daquelas plantas que Dona Santa retirava as flores que adornavam o oratório
onde ficavam seus santos de devoção.
Quinzin se lembrou da voz suave e do semblante terno
de Dona Santa e prometeu a si mesmo que cuidaria muito bem daquele lugar.
Viu Dimas sumir em meio às tabuas do curral cheio de
reses àquela hora e foi cuidar de sua obrigação. Recolheu os ovos, depois foi
para a horta e molhou direitinho os canteiros. Depois, regou e limpou as
plantas de Dona Santa e voltou à horta para limpar os canteiros. Observando
melhor tudo o que havia ali em volta, compreendeu que nunca faltaria trabalho
para ele, pois o local era bem grande, com uma variedade imensa de plantações.
Estava feliz e fazia com zelo e atenção o que lhe fora recomendado.
A rotina do dia anterior se repetiu. No meio da manhã,
uma das mulheres da cozinha veio chamá-lo para merendar, e Quinzin, apesar de
não estar com fome, obedeceu.
No caminho, viu uma velha senhora idosa, debruçada
sobre algo redondo, esquisito. A mulher que fora chamá-lo, vendo que ele a
observava, se apressou em dizer:
- É Dôrinha, uma velha que mora aqui desde menina.
Dizem que é louca, e se ela te dizer alguma coisa, não ligue. Ela não está mais
certa, e a única coisa que ainda faz é tecer rendas de bilro. Que aliás, faz
muito bem feito.
Rendas? Bilro? Que palavras eram aquelas? Por timidez
ou cuidado, resolveu ficar calado, afinal, tinha outras preocupações e
obrigações naquele dia.
Comeu a merenda que lhe deram e voltou ao trabalho. Na
volta, observou a velha Dôrinha, desta vez, mais detalhadamente. Tinha a pele
negra e os cabelos desgrenhados e brancos, com um cachimbo no canto da boca que
parecia apagado. Apesar da idade,
mantinha os olhos fixos no local onde estavam um número grande de agulhas, e
movimentava com imensa destreza uma espécie de palitos com um algo parecido com
casca de coco tucum na ponta. Por alguns instantes ficou a observar seus
movimentos, interrompido em seu torpor pelo olhar que a ela lançara em direção
a ele, voltando sua atenção para o trabalho. Foi o suficiente para Quinzin se
apressar em voltar para a horta.
Chegou a hora do almoço e ele novamente, se viu em
meio àquela aglomeração de pessoas, algumas cujas feições iam se tornando
familiares. Destacavam-se no meio daquelas pessoas Dimas, Dona Lena, Dona Santa
e Seu Jessé.
A tarde, transcorreu sem novidades. Apenas fora
interrompido em seu trabalho quando Dona Lena o chamou para ir até a cozinha
para merendar. Ficou sem graça, pois não estava acostumado a ser tratado
daquela maneira. Desta vez Dona Lena disse que quando chegasse a hora, seja
para lanchar ou almoçar, era para ele vir, pois nem sempre haveria alguém para
chamá-lo. Degustou as quitandas, tomou o suco e se sentiu feliz e agradecido.
Ele olhou para aquela senhora, tão gentil e cuidadosa com ele, sentiu ali a saudade
de sua mãe. Olhou em volta e viu que as pessoas que ali passavam tinham todas
um semblante bom, não havia cara ruim nem sinais de violência ou raiva.
Imaginou vivendo ali, no meio de gente bondosa e feliz.
Se apressou a voltar ao trabalho, pois precisava
terminar de limpar um extenso canteiro de couve. Trabalhando sozinho, imerso em
seus pensamentos de criança, lembrou que naquele
dia Dimas perguntou se ele sabia ler e escrever. Encheu os olhos de lágrimas ao
dizer que não. Recordou que dos irmãos mais velhos, Dé e Tiquinho já haviam ido
na escola. Ele, Toim e Dió, não tiveram oportunidade de aprender.
No fim da tarde, Dona Santa veio até ele, dizendo que
era hora de ir para casa. Ficou surpreso quando ela entregou a ele uma pequena
sacola com algumas peças de roupas, além de uma pequena marmita com comida.
— São usadas, mas estão em bom estado, e até que você
cresça, servirão. E essa comida é para você e seu pai jantarem. Agora pode ir.
Quinzin, ainda receoso, mas convencido que tinha que
ser forte e não ter medo de andar sozinho na estrada, tomou o rumo de casa.
Rapidamente se viu diante da casinha simples, que
embora fosse palco de inúmeros momentos de tristeza, paradoxalmente era onde
estavam suas melhores lembranças, como de sua mãe cantarolando para embalar seu
sono ou as brincadeiras com os irmãos.
Deu a volta pelos fundos, abriu a porta da cozinha,
colocou a sacola de roupas sobre o jirau e a marmita com comida sobre o fogão.
Desceu para o terreiro e foi dar milho para as
galinhas e comida ao porquinho, que como sempre, repetiu a cantilena com
barulhentos gritos e sua fome incontrolável.
A tarde ainda se fazia presente e as últimas luzes do dia teimavam em
permanecer. Cores, formas e beleza juntas tornavam ainda mais belo aquele
momento.
Viu ao longe que o pai estava chegando e resolveu
voltar para casa, imaginando que ele iria ligar o rádio e gostar da comida que
Dona Santa enviara. Era bom ouvir canções ou mesmo aquele falatório que nem
sempre conseguia entender, mas gostava.
Ao se aproximar, foi surpreendido pelo grito:
— Moleque, o que é isso?
Tremeu e sentiu o chão lhe faltar. Em segundos,
procurou pensar sobre o que fizera de errado, afinal, nem adentrara direito a
casa, fora logo dar comida aos animais domésticos...
Viu o pai surgir na porta da cozinha, com aquela
conhecida expressão de ódio e terror. E gritou:
— O que é isso?
Quinzin viu que ele tinha nas mãos a marmita de comida
e a sacola de roupas que trouxera.
Trêmulo e quase sem voz. balbuciou:
— Eu ganhei.
— Você foi pedir cosias na casa dos outros, moleque?
— Dona Santa me deu...
Foi a gota d´água para o horror explodir. O pai jogou
a marmita de comida em sua direção, acertando em cheio no peito franzino.
Instintivamente o menino tentou correr para se defender, mas era tarde, estava
paralisado pelo medo. Viu o pai crescer, se tornar um gigante e vir em sua
direção com o relho que fazia as vezes de cinto, e ainda da porta da casa deu a
primeira lapada.
Sentiu imensa dor e aquele relho maldito a cortar suas
carnes. Viu quando o pai levantou a mão e deu a segunda chibatada, desta vez
muito mais violenta, no pequeno e delicado rosto. O sangue quente começou a
escorrer pela face. Jogou-se ao chão esperando mais e mais pancadas, quanto
ouviu um estampido, seguido de uma voz forte e firme, que gritara:
— Pare com isso! Você quer matar esse menino?
De olhos fechados e sentindo muita dor, viu apenas o
pai dizer que ele precisava ser corrigido, pois andara pedindo coisas na casa
dos outros. Reconheceu pela voz quem estava ali: o Sr. Jessé.
Não conseguiu ver mais nada. Sentiu apenas que alguém
o pegava nos braços. E acordou horas mais tarde.
Sem abrir os olhos imaginou, ainda sem entender o que
havia acontecido, que a mãe viera salvá-lo. Aos poucos foi despertando e
reconheceu a figura de Dona Santa a seu lado, acompanhada de Dona Lena e Dimas.
Estava em uma cama limpa, em um local desconhecido e totalmente diferente de
sua casa, de sua esteira. Ainda alternando sonolência, ouviu o que ocorrera.
Seu Jessé, atendendo a esposa, fora até sua casa pedir
que o pai o deixasse morar na fazenda, para que pudesse receber cuidados e
estudar, mas sem perder o vínculo.
Mas, ao chegar, se deparou com aquela cena horrenda,
dos gritos e da agressão.
Como o pai não atendia, o Sr. Jessé precisou fazer um
disparo para o alto, para que tivesse a presença notada.
Ao ouvir o barulho do estampido, assustado, arrefeceu
sua fúria, voltando a ser todo servil e cheio de mesuras.
Vendo o estado do menino, o Sr. Jessé o tomou nos
braços, colocou no cavalo e levou para casa, pedindo ao chegar que Dimas e Dona
Lena cuidassem dele. Até a velha Dôrinha fez suas meizinhas.
Quinzin sentiu que doravante, seria ali sua vida,
junto àquela família. Em seu coração inocente quis perguntar pelo pai, mas
preferiu ficar calado. Ainda sentindo as
dores, conseguiu sorrir, enternecido pelo carinho que estava recebendo.
Sentiu que um novo tempo, uma nova vida começava. Sem
violência e sem gritos. Poderia até, começar a sonhar que talvez um dia
reencontrasse os irmãos.
E quanto ao pai, soube depois que o Sr. Jessé o
demitiu do eito e mandou que deixasse suas terras.