sábado, 3 de dezembro de 2011

O PLANTIO DA ROÇA


O menino Toninho acordara mais cedo naquela manhã de chuva fina e intermitente. Era o grande dia do inicio do plantio da lavoura na roça nova, onde há pouco mais de um mês seu pai derrubara e fizera a grande queimada.
Não parecia que já havia passado tanto tempo. Agora o menino Toninho, ansioso, mal conseguia aguardar a hora de ajudar seu pai a colocar as sementes na terra.
Depois da queimada ainda tiveram muito trabalho. Removeram os restos de galhos e os amontoaram em grandes leirões chamados coivaras. Ainda fizeram a queima dos tocos maiores, que ficaram parecendo enormes figuras humanas, por causa do fogo. Ficaram até engraçados.
Mais algumas semanas e vieram as chuvas. No inicio, fortes, com muito trovão e ventania, porém de pouca duração, não firmavam. Ainda não era a chuva ideal para que se pudesse plantar. Todos os dias o menino Toninho via seu pai fitar o horizonte, ao cair da tarde, a observar os sinais da natureza no céu. E seu pai compreendia esses sinais. Uma tarde ele afirmou que logo, a chuva firmaria. O menino Toninho entendeu que em breve chegaria a hora do plantio.
E a chuva começou na tarde do dia anterior. Forte no inicio, entremeando réstias de sol entre as nuvens densas e pesadas, até firmar em um tempo fechado, com chuva para todos os lados. Logo caia uma chuva calma, constante.
Viu seu pai separando as sementes e as ferramentas, limpando a velha matraca. Teve então a certeza que o trabalho começaria.
O menino Toninho ao ouvir sinais que o pai levantara, também pulou cama e foi juntar-se a ele. Notou alegria e satisfação em seu semblante, ao vê-lo ali naquela hora.
Mal pôde esperar o fim do café da manhã, que sua mãe carinhosamente colocara na pequena e rústica mesa, composto de queijo, requeijão, leite, café e algumas bolachas, feitas ali mesmo. Mas o menino Toninho queria mesmo era ir logo para a roça.
No caminho ficou mais feliz ainda ao receber a promessa de seu pai que, se tudo corresse bem com a lavoura ele ganharia um par de chuteiras azuis, dessas de jogar futebol, novinha. Era seu sonho de menino ter uma chuteira como seus ídolos naquele lugar.
Começaram o trabalho plantando primeiramente o milho. Seu pai ia à frente abrindo pequenos buracos no chão. O menino Toninho vinha em seguida jogando as sementes e chegando terra nas covas com um movimento dos pés. Era um trabalho ritmado, constante e rápido. Nem uma topada que dera em um toco escondido no chão o fizera desanimar. Vez em quando uma pequena parada para beber água e logo em seguida voltar ao trabalho.
Nem notara o tempo passar. Vira apenas que já havia passado algum tempo ao avistar sua mãe. Trazia o lanche, que chamavam de merenda, juntamente com o almoço. E foi debaixo de uma grande árvore remanescente eles se agasalharam como puderam e fizeram ali mesmo sua refeição.
Foi assim durante todo o dia. Apesar de franzino o menino Toninho não sentiu o cansaço que tomava conta de seu corpo esquálido. Estava feliz. Trabalhara muito, ajudara o pai a plantar as sementes de milho, arroz e também, junto às coivaras, de abóbora e melancia. Durou quatro dias o trabalho na roça. O menino Toninho já sabia que, passados alguns dias era somente fazer a desbrota removendo os brotos que nasceriam nos tocos queimados pelo fogo. Insistentes em sobreviver - sapiência da natureza.
Agora era esperar para em breve ver a roça bonita, viçosa, com os imensos cachos amarelos de arroz vergados, com as doces melancias próximas às coivaras e com as grandes espigas de milho. Era certeza de mais um ano com fartura. E o menino Toninho sonhou com o par de chuteiras azuis prometido por seu pai.

4 comentários:

  1. Depois de queimadas as coivaras restava matar as formigas. Na época, eu me lembro que despejavam formicida (líquida) nos olheiros dos formigueiros e deixavam apenas um aberto. Nesse ateavam fogo e em segundos a terra explodia por dentro - de alguns olheiros saia fumaça. Na verdade matar as formigas era até meio folclórico e tinha muita preocupação, pois se alguém inalasse o seu cheiro poderia morrer na hora. Os pais ficavam desesperado com a molecada que insistia em ficar bem perto. Alguns pais da época eram muitos severos. Ah, mas não tenham dúvidas, eles também deixavam aflorar as suas molecagens ou traquinagens.

    ResponderExcluir
  2. Velhos tempos que não voltam mais. Hoje em dia, o pai chama o filho pra lavar o carro e ele nem quer saber. E que desejos simples heim? Nada de videogames caros, televisão, internet.. só uma chuteira azul dos craques é que tá valendo. Por incrível que pareça ainda existem muitos Toninhos pelo mundo. Que se multipliquem na sociedade hoje.

    Bem escrito Américo.

    ResponderExcluir
  3. Algumas pessoas escrevem com uma caneta, outras com a alma... Outras com o coração...Parabéns!

    ResponderExcluir